"O Mundo não é uma herança dos nossos pais, mas um empréstimo que pedimos aos nossos filhos" (Autor desconhecido)

terça-feira, 13 de março de 2012

António Fernandes

Exploradores, Viajantes e Aventureiros



António Fernandes - (?/ 1525) - Explorador. Condenado à morte, não se sabe por que crime, no reinado de Dom Manuel I, vê a sentença ser tansformada em degredo. Integrado na armada de Pedro Álvares Cabral, em 1500, é lançado (1) em Mombaça e, daí, segue para Quíloa, onde obtém as boas graças das autoridades locais. Na segunda viagem que faz para a Índia, Vasco da Gama vai encontrá-lo em Quíloa, onde serve de língua (2), tendo: "prestado informação a João da Nóvoa acerca do que se passava entre aquela bárbara e infiel gente", segundo relatou posteriormente o cronista João de Barros, nas suas "Décadas".

Por volta de 1505 ou 1506 encontra-se na feitoria de Sofala e, aventurando-se no interior, António Fernandes atinge as terras do Reino do Monomotapa e priva com o monarca, sendo o primeiro português a chegar àquele Reino. Entre 1511 e 1515 percorre, em diversas viagens, as terras do Reino do Monomotapa, vistoriando a actividade mineira  no mesmo e todas as informações colhidas transmite-as aos seus conterrâneos.

O seu peregrinar exploratório levou-o, também, a percorrer outros reinos, tais como os de Sedanda, Quiteve e Butua, pelo que é considerado como o primeiro português a internar-se não só no sertão moçambicano mas também no interior zimbabuano. Terá atingido um grande prestígio no seio das populações nativas do interior africano e, sobre ele, Gaspar Veloso escreveu: "...onde ele vai ainda que haja guerra por amor dele logo são apagadas...". Este notável aventureiro e explorador morreu em Sofala.

(1) - Lançado - Degredado que, no decurso duma viagem marítima era deixado, ao abandono, num qualquer ponto da costa africana, com a finalidade de estabelecer relações com os povos locais e transmitir essas informações a um próximo navio que por ali passasse.

(2) - Língua - Intérprete.

Língua do Estado - Intérprete oficial.

Historiando Moçambique Colonial

Reino do Monomotapa - Reino territorialmente extenso; cuja área abrangeria, nos tempos actuais, parte da zona oriental do Zimbabué e os territórios moçambicanos situados entre os rios Limpopo e Zambeze e que, desde sempre, povoou o imaginário dos portugueses, ávidos de lucro fácil e rápido, pois as informações que possuíam deste Reino é que era extremamente rico em ouro, esse mítico mineral que tanto aguçava o apetite dos conquistadores. A existência deste Reino, que bebeu parte da sua estrutura cultural do Reino do Zimbabué, com a proliferação de histórias sobre as suas míticas riquezas, é que levou os portugueses, logo no início das suas viagens marítimas para a Índia, nos anos quinhentos, a estabelecerem uma feitoria em Sofala, cuja missão principal era a de comerciar o ouro vindo desse Reino. No entanto Sofala acabou por ser um desastre económico para os cofres portugueses, não só porque o Monomotapa não possuía o ouro que a avidez lusitana lhe queria atribuir, como também a actividade de guerrilha comercial levada a cabo pelos arabizados lá instalados há bastante mais tempo naquelas paragens, minava a corrupta administração portuguesa. Ter-se-á iniciado a partir de linhagens carangas do planalto setentrional zimbabuano que, no século XV, se terão fixado no vale do rio Alto Luia, afluente do rio Mazoe que, por sua vez é afluente do rio Luenha e expandido, posteriormente, avassalando outros povos e reinos e nunca se tendo avassalado ao Reino do Zimbabué. A palavra "monomotapa" é a grafia aportuguesada de "Muene Mutapa" (Rei Mutapa) que foi um poderoso chefe que viveu no princípios do século XV, de verdadeiro nome Nzatsimba e que adoptou, como nome de guerra, o de Muntoba Ihuru Chamutapa. No entanto, foi o seu filho herdeiro Matope quem, após diversas incursões militares fundou, verdadeiramente, o Reino do Monomotapa, ao qual se encontravam mais ou menos avassalados outros reinos de menor dimensão territorial. Na linha sucessória, após a morte de Matope, ocorrida em 1480, o seu filho Nizima, sem o rasgo militar do seu pai, assiste ao desmoronar do Reino, criando-se outras dinastias rivais, das quais a mais importante terá sido a do Reino de Changamira, fundado por Changa, ex-Governador do Reino no tempo de Matope, a quem serviu com lealdade. Serão os changamires quem, no correr dos tempos, destruirão o poder real do Monomotapa, até que este se tornou num joguete nas mãos dos portugueses. Quando estes chegaram a Sofala já o Reino do Monomotapa abanava nas suas estruturas, mas o seu nome ainda inspirava sonhos fantasiosos de lendárias minas auríferas. No entanto, povos vindos do Sul sublevam as tribos do Reino a não pagarem tributos ao Muene, o que também facilitou a penetração portuguesa. Em 1560 uma missão jesuíta, encabeçada pelo Padre Dom Gonçalo da Silveira, atinge a corte do Monomotapa onde é bem recebida mas, fruto das intrigas dos islamizados, o prelado acaba morto tornando-se, assim, no primeiro mártir daquela confissão religiosa em terras do interior de Moçambique. Nove anos depois os portugueses, invocando várias razões, entre elas a morte de Dom Gonçalo da Silveira, enviam uma força numerosa para punir o Monomotapa. Reinando, em Portugal, Dom Sebastião, foi reunida a Mesa da Consciência, constituída por teólogos e juristas do Reino português, nas Cortes de Almeirim, em Janeiro de 1569, onde determinaram: "... os imperadores de Monomotapa mandam matar e roubar, muitas vezes, os seus vassalos e inocentes e fazem outros males e tiranias por causas leves e mandaram matar e roubar alguns portugueses, indo eles pacificamente e sem escândalo, antes com a sua doutrina e com exemplo se converteu el-rei, a rainha e os principais do reino, os quais depois todos apostataram, deixando a fé de Nosso Senhor Jesus Cristo que professavam, voltando aos seus tiros gentílicos e, na morte do dito Padre D. Gonçalo da Silveira, não se guardou ordem natural nem figura de juízo..."; "...e visto outrossim, como roubaram e retiveram na sua terra dois portugueses que iam mandados pelo Capitão de Sofala para embaixadores, sendo eles invioláveis, segundo comum direito das gentes..."; "... e acolhem nas suas terras muitos mouros, inimigos da fé de Nosso Senhor Jesus Cristo e que foram autores de muitas das ditas ofensas e lesões e o serão ao diante, sem se provar, que da parte dos ditos portugueses houvesse culpa ou desordem." Por fim decidiram: " Pode e deve El-Rei Nosso Senhor mandar promulgar o Santo Evangelho nos reinos e senhorios do Monomotapa..." Em relação ao desencadear da guerra aconselhavam: "... que, antes de se fazer a guerra ao dito rei do Monomotapa, se lhe requeira em nome de El-Rei Nosso Senhor que lance logo, em tempo limitado, todos os mouros de suas terras e senhorios, como inimigos que são da fé de Nosso Senhor Jesus Cristo e entregue os mais culpados..."; "... e não deferindo o dito rei este requerimento e não lançando nem entregando os ditos mouros pode-se-lhe fazer guerra e seguir todos os direitos dela." No entanto, quer a morte do jesuíta D. Gonçalo da Silveira quer os outros motivos invocados não passaram de um pretexto oficial para sancionar uma invasão que nada mais tinha em mira senão o de atingirem as miríficas minas de ouro do reino, que tanto apetite abria à gula lusitana. Esta expedição, comandada por Francisco Barreto parte, da ilha de Moçambique, em Novembro de 1571 com destino a Quelimane e, a 18 de Dezembro seguinte, flecte para Sena, via Zambeze. Em Julho de 1572, depois de reorganizadas as forças em Sena, Francisco Barreto interna-se no Barué e razia alguns regulados daquela zona, até que chegam a Sena enviados do Reino do Monomotapa, que aceitam as condições dos portugueses. No balanço final, esta expedição saldou-se num novo fracasso, não por acção dos guerreiros do Monomotapa mas por incúria dos portugueses que, minados por febres tropicais, falta de comando militar efectivo (já que este tinha que submeter as suas decisões à chefia religiosa da expedição entregue ao padre jesuíta Monclaro, numa controversa decisão emanada de Lisboa) e sem nenhum apoio logístico perderam, nas matas, a quase totalidade dos expedicionários, incluindo o seu comandante e sem terem atingido os seus verdadeiros objectivos finais que era o de tomarem posse das minas de ouro do Reino africano. No entanto, apesar de militarmente esta expedição ter sido um desastre, ela trouxe, aos portugueses, um mais aperfeiçoado conhecimento do terreno o que lhes facultou, mais tarde, um melhor implante na escolha dos locais e das rotas das suas actividades comerciais. Vasco Fernandes Homem, que assume a chefia do que resta da expedição após a morte de Francisco Barreto, efectua um levantamento parcial das minas do Reino, apercebendo-se da sua fraca produtividade. No entanto, em 1589, Gatsi Rusere sucede a Nogomo e, tendo que fazer frente a revoltas intestinas no Reino, pede auxílio aos portugueses por troca da concessão das suas minas de ouro. Por essa altura já as matas são palmilhadas por muitos aventureiros, que se vão sedentarizando em diversas zonas do Reino, criando os seus próprios estados, enquadrados por temíveis milícias de escravos começando, assim, a ascenção dos prazos, que também ajudam à minagem do poder do Monomotapa. Entre 1611 e 1612 Dom Estevão de Ataíde (1) promove outra incursão militar a este Reino e ordena a construção de fortes e feiras que melhor cimentam a influência portuguesa. Os monomotapas tornam-se dependentes dos portugueses e, em 1616, necessitam do auxílio militar destes para fazerem face a convulsões internas, tendo para tal Belchior de Araújo, Capitão-Mor de Tete, acorrido em seu auxílio. Só em 1628 é que Nyambo Kaparidze, referido pelos portugueses como Capranzine, guerreia os seus opressores, auxiliado pelos reis do Quiteve e de Manica, o que origina a morte de centenas de portugueses. No entanto, a resposta portuguesa é fulminante e Diogo de Sousa, liderando um força militar portuguesa, reprime a revolta. Derrotado, Capranzine retira-se e, daí em diante, os  monomotapas são eleitos, muitas das vezes, consoante o interesse dos portugueses adoptando, inclusivé, nomes lusitanos como, por exemplo: Mazuva / Dom Filipe; Siti Kazumku Musapa / Dom Domingos. Em 1630 o Monomotapa Mavura expulsa os mercadores árabes ou arabizados instalados no seu Reino. Minados, os  monomotapas tornam-se vítimas do Changamire Dombo que, em 1693, lhes guerreia sem quartel, obrigando o Monomotapa Mandhé Pedro a refugiar-se em Tete, sob total alçada portuguesa. No início do século XVIII o Reino encontra-se em guerra civil que só terminará no início da segunda década desse mesmo século, fruto de lutas por sucessões dinásticas, ocorridas após a morte do Monomotapa Macombué. Dois dos seus filhos disputaram o poder a um outro, Nhacumnembire, que acabou derrotado e exilado no Reino de Changamire. Por volta de 1760 o Monomotapa Mupunzagatu foi assassinado, o que arrastou o Reino para outro período de guerra civil que originou, de vez, a quebra do que restava do poderio deste Reino, que acabou diluído em diversos regulados, ao sabor das conveniências portuguesas. Por esta altura as fronteiras do Reino estavam diminuídas e fixavam-se, parcialmente, na área de Tete, a sul do rio Zambeze. A principal causa da extinção deste Reino residiu na incrementação da política de instalação de novos prazos, nos quais os prazeiros, com os seus exércitos de achikundas munidos de armas de fogo, debelavam qualquer tentativa de autonomia. Contam-se, entre os prazeiros que assinaram a sentença definitiva do Reino do Monomotapa, Inácio de Jesus Xavier, João Lobo, José de Araújo Lobo,José do Rosário Andrade, Sebastião Morais de Almeida, Vicente José Ribeiro e Vicente Ribeiro da Fonseca. Em finais do século XIX o Monomotapa rebelar-se-á contra os portugueses, através do seu Rei Kandi e, depois, pelo seu filho Chioco, revolta essa que será definitivamente finda com a morte deste.

(1) - Já biografado a 01/02/2012.

Reino de Changamire - Vasta região do interior africano meridional, de limites incertos mas que se situava a Oeste do rio Save (territórios dos matabeles) no que é hoje o Zimbabué. Rico em minério, o seu ouro era comercializado em Sofala. Os seus chefes tiveram influência decisiva no Reino do Monomotapa, chegando a assumir a dinastia no decurso do século XVI. Foi um changamire, alto funcionário do Reino do Monomotapa que, em finais do século XV, rebelou-se contra o Monomotapa, assassinando-o juntamento com grande parte dos seus filhos. Cerca de cinco anos depois um dos filhos sobreviventes conseguiu executar o changamire, tendo os descendentes deste se refugiado no Reino do Butua. No decurso do século XVIII este Reino deu ampla protecção à feira do Zumbo, principal entreposto para exportação dos seus artigos para o litoral norte moçambicano, se bem que não autorizassem os comerciantes portugueses a penetrarem no seu território. Em 1743 o Changamire puniu forças suas que saquearam o Zumbo e, em 1772, outra expedição changamire salvou de novo esta feira, dum ataque das forças do Monomotapa Ganhambadzi, voltando-se a processar esta protecção em 1780. Os artigos comercializados giravam en torno do ouro, marfim, panos e missangas. A criação e posse de gado bovino era desenvolvida, não só por uma questão alimentar, mas também como forma de pagamento dos acordos nupciais, conferindo poder social e político, a quem possuísse grandes manadas. 


Reino do Quiteve - Integrava a nação chona e tinha a sua localização geográfica centralizada no actual Chimoio e estendia-se para Este até ao Dondo e para Oeste até Manica e, a Sul, até sensivelmente o rio Búzi. Presume-se que tenha sido em finais do século XIX que este Reino tenha iniciado um processo se separação do Reino do Monomotapa, o qual foi percorrido por António Fernandes, entre 1513 e 1514. Era rico, quer em agricultura quer em ouro e marfim e o seu Rei utilizava o título de "Sachiteve". Nas primeiras seis décadas do século XVI pouco se sabe deste Reino, havendo registos portuguese que, em 1561, entrou em conflito com o Reino do Monomotapa. Em 1574 o Sachiteve exige a Vasco Fernandes Homem que lhe indemnize os bens que este apropriava à força, acabando por o atacar na serra de Sitatonga, mas é derrotado e a sua capital incendiada. No ano seguinte submete-se aos portugueses, que lhe restituem os familiares aprisionados como reféns, tendo-lhes prometido também não vedar as rotas comerciais. Tornou-se independente do Reino do Monomotapa e, na relação com os portugueses, exigia a Sofala o pagamento anual da "curva", cifrada em 200 panos. Em 1640, auxiliado por Sisnando Dias Baião, o Sachiteve Peranha reassume o poder e reabre as terras do seu Reino aos portugueses. Este estado de graça durou apenas oito anos, altura em que mandou encerrar as minas de ouro e incrementar a agricultura, havendo a atestar tal facto, um relatório português que referia, em 1667, que o Quiteve não era produtor de ouro. Esta situação terminaria em 1676, quando diversos prazeiros mandaram assassinar o Sachiteve reinante e restauraram o domínio português. Em 1762 relatos portugueses referiam que o ouro deste Reino era de muito boa qualidade e que também era muito rico em marfim. Em finais do século XVIII o Reino do Quiteve era o mais importante economicamente, sendo apenas suplantado pelo do Monomotapa, tendo ainda sofrido um incursão militar portuguesa, por se ter aliado ao Reino do Changamire, a quem se avassalara. O primeiro quartel do século XIX apresenta-se turbulento, com crises dináticas em 1803 e instalação angune do chefe Nuqaba, que assolou a região entre 1827 e 1837, massacrando a família real em 1832. Dez anos depois o Reino é integrado no Reino de Gaza, por Manicusse, que entretanto derrotara Nuqaba. Manuel António de Sousa é nomeado Capitão-Mor do Quiteve e instala um conjunto de três aringas, que ligavam o rio Pungué ao Luenha, mas como o centro do Reino estava desprotegido este continuava a pagar vassalagem ao Reino de Gaza.


Reino do Butua - Nome atribuído pelos portugueses ao Reino dos povos chona-caranga, que se situava a Oeste do Reino do Monomotapa até ao princípio do deserto do Kalahari e, no sentido Norte-Sul, entre o actual Zimbabué (parte inferior) e o Transval, no que viria a denominar-se depois por Matabelândia (terra dos matabeles). O Butua, também referido pelos europeus como "Mãe do Ouro", era um dos reinos derivados do Reino do Zimbabué, tinha a sua capital em Khami e foi visitado por António Fernandes, que referiu ser o Reino muito rico em ouro. Pouco se conhece da estrutura interna deste Reino que não era vassalo do Reino do Monomotapa, com quem bastas vezes guerreava. Em 1640 estalou um guerra civil neste Reino, tendo sido massacrados diversos indivíduos ligados à corrente islâmica. Após ter sido deposto, o Rei do Butua pediu auxílio a Sisnando Dias Baião, que lhe reconquistou o trono abrindo, de seguida, o apetite a outros prazeiros que ali se instalaram. O Changamire Dombo ascende ao trono deste Reino e muda a capital de Khami para Danangombe, em finais do século XVII. 


Reino de Sedanda - Situava-se, geograficamente, a Sul do Reino do Quiteve. Estendia-se, sensivelmente, entre os rios Búzi e Save e terá sido visitado por António Fernandes, entre 1511 e 1512, podendo ter sido o seu fundador o Rei Inhamunda. Este Reino, em revolta contra o Reino do Monomotapa, do qual estaria avassalado, enviou em 1515 uma delegação a Sofala, a solicitar uma aliança com os portugueses bem como nomeação de representantes da Coroa Portuguesa na sua corte. Garantia, em troca, a liberdade de comércio e fornecimento de mercadorias. António Fernandes esteve nesse Reino, como representante dos interesses portugueses, entre 1517 e 1518, conseguindo aumentar o incremento comercial entre aquele Reino e Sofala. Em 1519 a situação piorou para os portugueses quando Inhamunda ordenou o bloqueio das rotas comerciais, confiscou mercadoria e escravizou enviados do Capitão de Sofala. Esta situação arrastou-se até 1526, apesar de cinco embaixadores do Reino de Sedanda terem visitado Sofala, em busca de resolução de conflito. Em 1526 Sofala fica cercada por forças do Reino de Sedanda o que obrigou o seu Capitão-Mor, Lopo de Almeida, a negociar, conseguindo-se o desbloqueio para as caravanas poderem circular. Após a morte de Inhamunda, parte deste Reino foi absorvido pelo Reino do Quiteve, obrigando os sedandas a rumarem para o Sul. No finaldo século XVI o Reino estender-se-ia do rio Save até à zona de Inhambane. Com a decadência de Sofala deu-se também a decadência deste Reino, tendo-se agravado no decurso do século XVIII, com a invasão de povos vindos do Sul, que se apossaram das suas riquezas. A posterior integração no Reino de Gaza e as actividades predatórias dos angunes levaram à quase destruição étnica, cultural e linguística dos sedandas, que se dispersaram no seio doutros povos, com quem se misturaram, o que também contribuiu para a sua auto-destruição.


Reino dos Tonga - No decurso do século XV ocupavam uma área que ia desde o rio Pungoé, a Sul, os rios Zambeze e Luenha, a Norte, e a Oeste e a Leste por diversas terras delimitadas por vários rios contando-se, entre eles, o Zangue, Mucua e Msicadzi. Culturalmente bem distintos dos chona-caranga, falariam uma língua com afinidades aos senas e o seu rei tinha o título de "Samungazi" que se corrompeu para o "Mongaz" português. Podem-se subdividir em dois grupos: os que se submeteram aos chona-caranga e ajudaram à formação do Reino do Barué e os que continuaram independentes e a resistir, quer aos monomotapas quer aos portugueses e angonis, entre outros. Dos tonga do Reino do Barué saíam as nomeações do "mukomowasha". Os tonga nunca foram integralmente dominados pelos monomotapas, que por diversas vezes pediram ajuda aos portugueses para os dominarem. Em 1572 batalharam os portugueses, contra a expedição de Francisco Barreto que, no entanto, contava entre os seus aliados tongas chefiados por Chombe e, apesar de vencidos, debelaram bastante as forças portuguesas e, de seguida, batalharam as forças do Monomotapa Nogono. No entanto, em finais do século XVI estavam formalmente avassalados ao Reino do Monomotapa. Em 1608 o Samungazi foi morto às ordens do Monomotapa Gatsi Rusere, que o desconfiava aliado dum rival, o que provocou a sublevação dos tongas. Em 1613 o Reino revolta-se de novo, o que obriga Diogo Simões Madeira a combatê-los, acabando por os derrotar, o que permitiu o restabelecimento do tráfego fluvial do Zambeze e o descongestionamento de Tete e das mercadorias para o reino do Monomotapa. Em 1640, um chefe Tonga, Sanapache, atacou diversos prazos, tendo sido repelido pelo prazeiro Lourenço Matos e, em 1667, face à constante prepotência dos prazeiros, despoleta-se nova revolta tonga, que acabou violentamente sufocada cinco anos mais tarde. Durante o século XVIII assistir-se-á à plena integração forçada dos tongas na política de consolidação dos prazos, desaparecendo este Reino, enquanto independente.



Dom Gonçalo da Silveira - (1523/1561) - Missionário jesuíta. Estudou na cidade de Coimbra, onde conheceu e se travou de amizades, para o resto da vida, com o grande poeta Luís de Camões que, mais tarde, cantará a morte do missionário na epopeia dos Lusíadas. Entrou para a Companhia de Jesus em 1543 e doutora-se em Teologia em 1550, em Espanha. Seis anos mais tarde segue para a Índia onde se manteve até 1560, tendo exercido o apostolado em várias partes do Oriente. Vai para Moçambique, decidido a ir ao Reino do Monomotapa, Reino este que lhe fora falado pelo Bispo católico de Cochim, Dom Jorge Temudo. Aporta à ilha de Moçambique em 05 de Fevereiro de 1560 e, acompanhado pelos padres André Fernandes e André da Costa, desce ao litoral de Inhambane, ao Reino Tonga. Demorando-se pouco e deixando aí os seus companheiros, regressa à ilha de Moçambique, onde organiza uma expedição religiosa ao tão falado Reino do Monomotapa. Atinge a corte do mesmo, depois de ter atravessado Quelimane, Sena e Tete, a 01 de Janeiro de 1561 onde é bem recebido. Encontra aí António Caiado, que lhe serve de intérprete, enquanto não domina a língua mocaranga, conseguindo autorização para exercer o sacerdócio junto dos súbditos tendo, inclusivé, baptizado com o nome de Sebastião o próprio Monomotapa. A facção árabe da corte, incomodada com a permanência dos cristãos, moveu-se junto do Rei convencendo-o que aquela expedição era a ponta de lança de uma futura invasão portuguesa, pelo que receberam autorização real para matarem o jesuíta. Alertado para a conspiração que se montava contra a sua vida, recusa abandonar a corte, mesmo a instâncias de António Caiado que, bem informado pelos seus espiões, sabia a noite em que iam matar o prelado. A tudo Gonçalo da Silveira recusou, preparando-se para ser assassinado, o que vem a acontecer na noite de 15 de Março de 1561, tendo o seu corpo sido lançado para uma lagoa, a nordeste da futura cidade colonial de Salisbúria. Os seus assassinos não lhe sobreviveram muito tempo pois, por decisão do Monomotapa, também foram mortos. 



António Caiado - (Século XVI) - Aventureiro e explorador. Viveu na corte do Reino do Monomotapa onde se consta que explorava minas de ouro, ofertadas pelo monarca, por volta de 1530. Aquando da primeira expedição portuguesa liderada por Dom Gonçalo da Silveira àquele Reino, António Caiado desempenhava também a função de Capitão de Portas (1) e serviu-lhe de intérprete não tendo, apesar de tudo, conseguido evitar que este fosse morto.


(1) - Capitão de Portas - A função de Capitão de Portas foi instituída pelo Monomotapa, antes dos portugueses lá terem chegado. Com o advento destes o cargo manteve-se, com a finalidade de gerir a comunidade portuguesa que demandava as terras do Reino do Monomotapa, mas passou a ser gerido só por portugueses. O Capitão de Portas era nomeado directamente pelo Vice-Rei da Índia, o que lhe dava autoridade sobre os portugueses e restantes europeus que frequentavam aquela feira e essa nomeação carecia do acordo do Rei do Monomotapa. No início estava estabelecido na feira de Massapa, que era uma das "portas" de entrada neste Reino (donde o título Capitão de Portas). Competia-lhe, não só a gestão e administração da justiça e cobrança de impostos das actividades comerciais bem como solicitar autorização do Rei para estes entrarem e saírem do Reino, para além da aplicação do "empata"  e era Provedor dos Defuntos (1A). As suas decisões eram inapeláveis e tinha direito de vida e de morte sobre todos os habitantes da feira. Por o relacionamento entre os portugueses e o Monomotapa passar pela sua "Mulher Grande" (1B), que era uma prerrogativa feminina, também se chamava ao Capitão de Portas a "Mulher Grande do Monomotapa".


(1A) - Provedor dos Defuntos - Cargo administrativo que tinha por função tratar de todos os assuntos relativos a um falecido, nomeadamente dos que não tinham familiares, facto muito comum na ápoca dos descobrimentos marítimos e da conquista territorial, assuntos esses que iam desde o registo do óbito e relato de suas causas ao funeral e arrolarem e zelarem pelos bens materiais do falecido, decidindo pelo seu destino competente.


(1B) - Mulher Grande - Nome dado, num harém, à primeira mulher casada e que, assim, se torna na principal.



Francisco Barreto - (1520 - 01/07/1573) - Oficial do Exército Português. Em 1548 vai para a Índia, como Capitão de Baçaim e, em 1555, é nomeado Governador da Índia, cargo que ocupou até Setembro de 1558. Durante a sua estada na Índia ganhou a alcunha de "Louco", fruto da sua audácia demonstrada nos combates em participou, colocando-se sempre à frente dos seus homens para dar o exemplo. Regressado à metrópole prosseguiu a sua carreira militar até que, por se encontrar arruinado financeiramente, aceitou a missão de comandar uma incursão ao Reino do Monomotapa, a fim de conquistar as minas de ouro e punir as afrontas que o Rei daquele potentado africano infligia aos portugueses contando-se, entre estas, a morte de Dom Gonçalo da Silveira, de quem Francisco Barreto fora amigo. Desembarca em Moçambique em 1570 e a expedição, iniciada no ano seguinte, salda-se num desastre total, culminando com a sua morte nas margens do rio Zambeze, sem atingir os objectivos. 

Vasco Fernandes Homem - (século XVI) - Explorador. Integrado na expedição punitiva ao Reino do Monomotapa, de 1571 e chefiada por Francisco Barreto, assume o comando da mesma em 01 de Julho de 1573, após a morte deste em Sena. Regressando a Sofala, com o que restava da expedição, volta a partir de novo, em 16 de Maio de 1574, para o Reino do Monomotapa, que percorre durante dois anos. Era proprietário de vastos territórios na região de Chironga, a Oeste do Reino do Quiteve, onde se dedicava à exploração aurífera. Apercebendo-se que as famosas minas de ouro do Reino, que tanta lenda tinham criado e tantas mortes e guerras haviam causado, não possuíam a riqueza que se presumia, desfez-se das suas terras e retornou a Sofala, de vez, em 26 de Setembro de 1576. Terá aqui falecido. 

1 comentário:

  1. Que jeito me faria ter lido este "post" quando estava a escrever sobre o "Reino do Monomotapa", um dos volumes da minha colecção juvenil sobre o Pêro da Covilhã e depois também no "Espião de D. João II.
    Belo trabalho!
    Saudações amigas.

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