"O Mundo não é uma herança dos nossos pais, mas um empréstimo que pedimos aos nossos filhos" (Autor desconhecido)

sábado, 24 de março de 2012

Mary Mitchel Slessor

Mary Mitchel Slessor



Mary Mitchel Slessor - (Aberdeen (Escócia), 02/12/1848 - Calabar (Nigéria), 13/01/1915) - Missionária da Igreja Presbiteriana Unida da Escócia.

Cresceu no seio duma família pobre, filha de pai alcoólico e tendo seis irmãos. Desde muito nova que começou a frequentar a Igreja local, tornando-se profundamente religiosa. Será, aliás, a sua profunda reliogisidade que a acompanhará até ao fim dos seus dias e que lhe dará forças para as provações que sempre suportou. Em 1859 a família muda-se para Dundee, mas a vida continu a não lhes sorrir fruto do vício do chefe de família. Com onze anos de idade é obrigada, tal como a sua mãe, a ir trabalhar na indústria têxtil, para reforçar o provento familiar, trabalhando durante doze horas na fábrica, onde só tinha duas horas para refeições. Os estudos ressentem-se e a fome é uma constante na casa familiar, onde o alcoolismo do pai roubava os magros proventos para sustentar o seu vício. Só com a sua morte é que, lentamente, a vida começou a suavizar-se na família. Durante 14 anos trabalha na fábrica, sempre doze horas por dia, para além de ao fim de  semana refugiar-se na Igreja.

O seu sentir missionário começa a avolumar-se, desde que, em criança, lera histórias de missionários que a sua Igreja tinha, em diversas partes do Mundo, desde a China ao Calabar. A morte de David livingstone, outro missionári escocês, oxorrida em 1874 veio a despoletar de vez essa sua intenção de partir. Inspirando-se na obra de David Livingstone, a 05 de Agosto de 1876, Mary Slessor parte de Liverpool, a bordo do "Etiópia" com destino a uma Missão da Igreja Presbiteriana Unida no Calabar (ao sudeste da actual Nigéria), como professora-missionária, onde chega a 11 do mês seguinte, ficando colocada em Duke Town, durante quatro anos. 


Em 1879 retorna à Europa a tratar-se,por doença, regressando ao Calabar no ano seguinte, onde lhe encarregam de tratar dos assuntos femininos na Cidade Velha. Aqui ficará dois anos, sendo a única europeia ali a viver. Em 1883 vem de novo à Escócia, para novos tratamentos da sua saúde debilitada, onde fica durante dois anos. No regresso ao Calabar o seu destino é ir viver no meio da tribo Ibaca, a pedido do seu rei, Ocon. Depois segue a fixar-se em Town Creek, onde fica seis meses.

Colocada, inicialmente, em missões litorais conseguiu, após várias insistências, ser colocada no interior  do território, onde só iam homens, pois eram terras de caçadores de cabeças e de canibais. Assim, a 03 de Agosto de 1888, parte para a aldeia de Okoyongo onde chega, depois duma violenta jornada, por rios e trilhos, onde a fome, as roupas encharcadas e, sendo a única pessoa europeia na viagem, a ter que confiar nos acompanhantes de circunstância, tornaram a viagem num pesadelo.

Durante cerca de 40 anos exerceu o seu apostolado no Calabar, superintendo várias missões no interior do território. De tudo um pouco esta valorosa mulher viu, assistiu e interveio, sempre que pôde na defesa dos fracos, dos oprimidos, dos humilhados. Desde mercados de escravos onde resgatou crianças; passando por crocodilos a procurarem pessoas junto dos rios; a um hipopótamo ter virado uma canoa onde seguia, só se tendo salvo por lhe ter atirado com uma panela para a bocarra; a suspeitos serem obrigados a mergulharem um braço em óleo a ferver para demonstrarem a sua inocência; a viúvas serem mortas para acompanharem os defuntos na outra vida; a gémeos serem amaldiçoados e mortos por serem obra de demónios, tendo salvo alguns; a salvar uma aldeia inteira de ser chacinada por alguns habitantes terem sido culpados pelos feiticeirtos pela morte do filho dum chefe tribal; a evitar conflitos bélicos entre tribos locais por questões de posse de gado ou de mulheres; de tudo o que se possa imaginar nessa antiga África do obscurantismo, do paganismo e da surpestição, Mary Slessor viveu. Viveu e combateu. 

A sua coragem de dizer "não" à barbárie, na cara dos que ordenavam tais barbáries; o exemplo abenegado que deu por várias vezes na defesa da vida de pessoas que a buscavam em fuga; a recusa no aproveitamento de bens materiais para seu próprio benefício; a altivez com que se apresentava perante potentados locais e olhava-os de frente sem medo; o ter demonstrado por várias vezes não recear a morte em exemplos nobres de resgate de pessoas; tudo isso grangeou-lhe respeito e admiração entre os nativos, que carinhosamente a apelidavam de "Ma" (Mãe). 

Ainda veio por mais duas vezes à sua Escócia (1898 e 1907), sempre em tratamentos das doenças tropicais mas, em 1908, regressa a África, de vez, onde virá a falecer.

Por tudo o que viveu, por tudo o que deu, por tudo o que fez, esta lendária mulher coragem entrou na História como a "Rainha Branca do Calabar".



Historiando Moçambique Colonial


Banto - Palavra criada pelo filologista Black (século XIX), estudioso das línguas dos povos da África Austral, que reparou que a raiz "tu" ou "ntu" (pessoa) era comum a tdos os idiomas. O plural desta raiz "ba-ntu" (povo, gente) generalizou-se e adoptou-se para designar todos os povos, a Sul do Equador, com uma remonta origem linguística comum.


Cambuemba - (?/?) - Lugar-Tenente de Manuel António de Sousa*. Quando este foi preso, juntamente com Paiva de Andrada e João de Resende, pelas forças da BSAC de Cecil Rhodes, em 1890, Cambuemba, juntamente com Luís da Gorongosa e Ghizi, também eles lugares-tenentes de Manuel António de Sousa, entraram em rota de colisão com os interesses portugueses. Batalhando sempre a Companhia de Moçambique, Cambuemba, operando a partir da sua aringa de Chemba, entre 1893 e 1896, expulsa dos prazos de Chiramba e Tambara os portugueses e chega a isolar Sena. Em 1896 estabelece acordos com o Bonga de Massangano e com o Reino do Barué.
Em Maio de 1897, sendo um dos líderes da revolta tonga, expulsa os europeus de diversos prazos, bloqueando a navegação fluvial do baixo Zambeze e voltando a provocar o isolamento de Sena. No entanto acaba derrotado, em Setembro desse mesmo ano, face ao poder de fogo das forças portuguesas, tendo estas conseguido uma vitória plena, destruindo quase todas as aringas inimigas,prendendo a maioria dos amambos senas e tongas e liquidando centenas de rebeldes.
Cambuemba refugia-se no Reino do Barué, na corte do Makombe Hanga*, que congrega à sua volta todos os opositores aos portugueses, juntamente com Luis da Gorongosa e Guizi. Em 1900 Hanga nomeia-o comandante das forças baruístas, apesar de ser do povo tonga e, dois anos mais tarde assume, directamente, a defesa de Missongue, a capital baruísta, contra o ataque português liderado por João de Azevedo Coutinho*.
Tendo sido derrotado nessa batalha acaba preso, na sequência da mesma, tendo sido deportado a ferros para a ilha de São Tomé, onde virá a falecer. 


* - A ser biografado.


Chibalo - Trabalho forçado. Era uma medida arbitrária e violenta, que a autoridade administrativa colonial impunha, justificando-se quase sempre com o argumento da indolência típica dos nativos. Ainda vigente no decurso do século XX, génese de muitas revoltas nativas contra os portugueses como, por exemplo, no Barué, aquando da ligação duma estrada de Tete para Macequece.
Pelo seu estilo de escravatura que esta medida impunha, as autoridades coloniais quase nunca pagavam o trabalho ou, quando o faziam, era de forma insuficiente. O conluio de régulos com a administração colonial, que os presenteava quando lhes arranjavam braços, contribuiu para queda do prestígio desta instituição no seio das populações.


Hanga - (?-Rodésia do Sul, 1910) - Makombe baruísta. Sucede a seu pai, Chipatata, depois de ter vencido outros pretendentes. Insubmisso aos portugueses consegue congregar, à sua volta, outros opositores dos mesmos, ultrapassando o conceito tribal. É assim que o vemos nomear, para o comando das suas forças, Cambuemba, que era tonga, o mesmo se passando para a nomeação do mukomowsha, bem como o ter-se aliado aos angunes e celebrado casamentos com  mulheres senas. Derrotou Manuel António de Sousa, que acabou morto pelas suas hostes. Em 1902, depois da queda de Missongue, capital do seu Reino, refugia-se na Rodésia do Sul e continua a fomentar revoltas contra os portugueses.  


Reino do Barué - A nação barué, desde sempre independente, situava-se a Norte do Reino do Quiteve, tendo como outros limites geográficos a Gorongosa a Este, a Zambézia a Norte e, a Sul, o rio Pungoé, sendo a sua população formada, principalmente, por chonas e carangas e que se fundiram, mais tarde, com tongas.
Os seus reis tinham o título de "makombes". Avassalado ao Reino do Monomotapa, em 1608 revolta-se contra o  Monomotapa Rutsi Ruserere, adquirindo a sua independência, mantendo-a até finais da década de 20 do século XVII, altura em que a perde momentâneamentenpara o prazeiro António Lobo da Silva.
Na primeira metade do século XVIII o Reino estende os seus domínios para Sul, até às margens do rio Luenha. Em 1788 o cientista Manuel Galvão da Silva percorre o Reino, que apresenta uma boa estabilidade política, marcando mesmo a sua independência pelo afrontamento que impõe aos portugueses, que têm que lhe pagar tributos, para poderem percorrer os seus territórios.
Entre 1828 e 1830, devido a uma crise dinástica, o Barué esteve sem Makombe, tendo o novo Makombe aceite um tratado de livre trânsito com as autoridades portuguesas. O Reino sofre incursões angunes entre 1834 e 1838 e surge nova crise dinástica, em 1846, quando surgem dois pretendentes: Chibudo e Chipatata, sendo o primeiro protegido por Muzila* que, no entanto não o consegue entronizar, acabando o segundo por ascender a Makombe.
Este Reino era desejado por Manuel António de Sousa* que, desenvolvendo a sua política de anexação deste território, guerreou e submeteu os senas e tongas, povos súbditos do Barué, o que obrigou Chipatata a aliar-se a Bonga*, de Massangano, inimigo jurado de Manuel António de Sousa. No entanto tal aliança não colheu frutos, o que acabou por obrigar Chipatata a reconhecer a superioridade militar de Manuel António de Sousa pelo que, em 1869, é este senhor da guerra quem salva o Reino do Barué de nova ameça angune.
No entanto Chipatata acabará por pagar caro tal aliança pois, ao permitir o casamento duma sua filha com Manuel António de Sousa, acabará por entregar o Reino nas mãos deste predador. Hanga, filho de Chipatata, consegue reunir à sua volta chefes baruístas que estavam descontentes com Manuel António de Sousa e conspiram contra o mesmo, mas acaba derrotado e foge para junto do Bonga de Massangano, onde se exila durante alguns anos, até 1890, quando as forças da BSAC de Cecil Rhodes** prendem Manuel António de Sousa, que escoltava Paiva de Andrada** e João de Resende, levando-os a todos para a África do Sul. Aproveitando este revés do seu inimigo, Hanga consegue sublevar o Barué e ainda capta a confiança militar de importantes lugares-tenentes de Manuel António de Sousa para as suas hostes:Cambuemba, Capovo, Luis da Gorongosa e Guizi (1).
Após se ter libertado da prisão sul-africana, por pressão do Governo Português junto das autoridades londrinas, Manuel António de Sousa parte à reconquista do Barué, com  o apoio de forças militares portuguesas, comandadas por João de Azevedo Coutinho*, mas acabará ferido e morto pelas forças de Hanga, que exibirá o seu crâneo como troféu valioso. Assim se reconquista a independência do Barué, em 1892, mas o Reino será atravessado por uma crise dinástica, pois ao trono perfilam-se Hanga e também Samaconde, ambos filhos de Chipatata. Samaconde acaba por ascender ao poder, em 1894, desenvolvendo uma política favorável aos portugueses mas acabará derrubado anos mais tarde, refugiando-se na Rodésia do Sul, onde morrerá exilado. Assim, Hanga ascende ao trono baruísta tornando-se, em difinitivo, Makombe, se bem que ainda tenha que derrubar outro rival, de nome Chipitura, acabando este por morrer em 1899.
A fim de fazer face à ameaça portuguesa Hanga tentou estabelecer acordos com o Bonga de Massangano e com os angunes, mas não logrou ter êxito nestas tentativas. Aliando-se aos tongas, Hanga trava a sua última batalha, em 1902, quando as forças portuguesas, de novo comandadas por João de Azevedo Coutinho,invadem o Reino em finais de Julho desse ano. Com a queda de Missongue, a capital do Reino do Barué, Hanga refugia-se na Rodésia do Sul, onde morrerá, em 1910.
O seu filho, Chikwore, sucede-lhe e subleva várias regiões de Tete e da Zambézia, em finais de Março de 1917, acabando derrotado por forças portuguesas no findar desse mesmo ano, pelo que, à semelhança do seu pai, refugia-se na Rodésia do Sul. As razões desta revolta prenderam-se com o recrutamento obrigatório de carregadores para a guerra que se travava contra os alemães (I Guerra Mundial, que será dissecada mais à frente) no Norte de Moçambique; com a imposição do imposto de palhota e com as brutalidades praticadas pelos sipaios nas populações indefesas, obrigadas a trabalhar em regime de escravatura (chibalo) na construção duma estrada que ligava Tete a Macequece.
Mas o Reino do Barué ainda iria provocar algumas dores de cabeça aos seus novos senhores pois, no ano seguinte, Makosa, primo de Chikwore, que ascendera a Makombe após a derrota e exílio do seu familiar, promove nova revolta contra os portugueses, provocando surtidas de guerrilha até Outubro de 1918, altura em que é definitivamente derrotado, refugiando-se em Mekoto, na Rodésia do Sul e desaparecendo, de vez, o Reino do Barué enquanto nação independente.


* - A ser biografado.

** - Já biografado.

(1) - Todos eles tinham o elo comum de terem servido sob as ordens de Manuel António de Sousa, de quem aprenderam as tácticas de combate. Existem poucas ou nenhumas referências biográficas destes, salvo o de Cambuemba, que foi o que mais se destacou dentre eles.
De Guizi sabe-se que casou com Nhana Imanga, uma das viúvas de Manuel António de Sousa, mas não soube aproveitar as vantagens políticas que este casamento lhe poderia ter dado em relação aos seus outros companheiros dissidentes. Combateu os portugueses entre Sena e Barué ao lado de Cambuemba, até que, em 1897, derrotado, refugia-se no Barué.
Todos estiveram presentes na derrocada de Missongue, em 1902, tendo Cambuemba sido preso e deportado, Luis da Gorongosa sabe-se que foi preso e desconhecendo-se o seu destino, nada tendo conseguido apurar dos outros.


Sipaio - Polícia indígena subalterno, sucessor do achikunda*. Diferenciava-se deste por não defender o prazeiro (que era um indivíduo defenido) mas sim a administração colonial (que era uma entidade abstracta), para além do facto de não só estar mais disciplinado, como também ter uma farda própria, que era igual em todo o território.
Elos importantes na ligação entre as populações e a administração colonial, aos sipaios que actuavam nas zonas rurais eram-lhes concedidos, no início, reminiscências do tempo dos achikundas, tais como o direito de saque, por exemplo. Com o evoluir dos tempos tais direitos foram sendo retirados e substituídos por formas mais modernas de subsistência, tais como vencimento fixo e subsídios.
O sipaio e o régulo, na grande generalidade dos casos, foram as duas entidades nativas que melhor facilitaram a vida à administração colonial portuguesa para se implementar no seio das populações.

* - Já fichado.



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Livro



"1421 - o ano em que a China descobriu o Mundo", de Gavin Menzies (Publicações Dom  Quixote, 2008, 527 págs.) é um livro polémico que defende a teoria de que, antes da costa americana ter sido atingida por Cristóvão Colombo (1492) e, também, que antes da viagem de circum-navegação planetária iniciada por Fernão de Magalhães e continuada por Sebastião del Cano ter sido completada (1521), já os chineses tinham navegado à volta do mundo, um século antes.
Segundo o autor, em 1421 um frota de cem navios chineses, comandada pelo Almirante Zheng He, saiu da China (governada na altura pelo Imperador Zhu Di), em direcção à Índia, desceu ao Cabo da Boa Esperança, cortou o Atlântico Sul, mapeou as costas sul-americanas, entrou o Pacífico e atingiu a Austrália, tendo retornado ao País em 1423, com apenas sete naus sobreviventes.
Ao regressar ao País Zheng He vem encontrar a Pátria num caos tremendo, já com outro Imperador no trono que, face aos custos da viagem e às dificuldades que se atravessava, ordenou a destruição da frota e dos documentos relativos à mesma, perdendo-se um espólio valioso.
Caberia, assim, à China a glória de ter sido a primeira Nação a circum-navegar o planeta, a descobrir a Antártica, a Austrália e a resolver o problema da longitude, segundo a tese apresentada por Gavin Menzies, Oficial da Marinha Britânica que, para consubstanciar a sua tese, viajou pelas sete partidas do mundo, percorreu a maioria dos países existentes onde vasculhou centenas de museus e bibliotecas.
No entanto a maioria dos historiadores contemporâneos, especializados nestas matérias de viagens náuticas, não aceita as teorias de Gavin Menzies, o que não obsta à leitura do livro.
Até porque o mesmo dá-nos pistas interessantes e põe-nos a pensar. Em suma, tira-nos as palas dos olhos.



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Filme


Ao deambular por uma livraria deparei com o livro "O nome da rosa", de Umberto Eco, agora segundo uma versão mais actualizada, com uns acréscimos. Não me convenceu, ficando sempre com a sensação de que é "mais do mesmo".
Mas veio-me à memória o filme inspirado nesta obra, realizado por Jean-Jacques Annaud, em 1986. Se, por norma, diz-se que um filme não consegue, por si só, transmitir toda a mensagem do autor do livro (o que não é de admirar face à limitação de tempo que um realizador dispõe) a verdade é que este filme é, na minha opinião, soberbo.
Aliás, é o único filme interessante na filmografia de Sean Connery.
Esta trama "policial", desenrolada na Idade Média, tem um naipe de actores com interpretações sem mácula, um  cuidado no guarda-roupa, nos diálogos e na cadência do desenrolar das situações, à medida que as mortes vão ocorrendo que fazem dele um filme que, para quem não goste de ler livros maciços, é mais do que suficiente para perceber a mensagem do escritor.
Sem dúvida, um filme a ver... ou a rever.
  

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Nasceram sete crias de lince ibérico, no Centro de Reprodução do Lince Ibérico, em Silves. Atendendo a que o lince é uma espécie em risco de extinção, aqui está uma boa notícia. É pena que estas boas notícias sejam cada vez mais raras. Mas enfim...
O que é mesmo pena é que a nossa classe política não esteja em vias de extinção.
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Em Toulouse (França), após 32 horas de cerco, a polícia invadiu o apartamento de Mohamed Mehra, suspeito de múltiplos homicídios naquela região, acabando o mesmo morto no decurso dessa acção (22/03).
Pergunto eu: 32 horas? Mas a Polícia não tem mais nada para fazer do que andar nesta palhaçada? Para gáudio da imprensa que adora este tipo de notícias: dá pano para mangas. 
Nunca ninguém me explicou a razão do arrastamento da resolução destas situações. Isto não tem muito que saber: é chegar ao local, interpelar o suspeito, dar-lhe um prazo e, caso este não se renda, é entrar e resolver a situação rapidamente. Muito mais quando nem sequer há reféns.

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Um gato foi atropelado numa rua, em Lisboa. Nada de especial. Infelizmente situações destas acontecem. Mas o que vem para o caso é que há mais de uma semana que o gato continua esparramado na rua. Cada vez mais espalmado contra o alcatrão, sempre que um carro passa por cima. À vista de todos nós.
Dos serviços de higiene camarários nada. Os homens da recolha do lixo dizem que só recolhem o lixo dos contentores. Num alerta dado por mim num departamento camarário, que sim senhor, que iam tratar do assunto. Então não? Está-se mesmo a ver. O gato, ou melhor, o que resta, lá continua, cada vez mais fundido com o alcatrão.
Quando chegar o Natal e vierem, todos pressurosos, baterem-me à porta a desejarem-me Boas Festas, de mão estendida, vou colocar-lhes, em vez duma nota, uma foto do gato esparramado.



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Enoja-me a posição de Eduardo Catroga, antes e depois de ser "chairman" da EDP. Dar o dito por não dito e tentar vender-nos gato por lebre. Aliás, este "pintelho eléctrico"  é o reflexo de grande parte da classe política portuguesa: vendedores da banha da cobra. Não passam dum bando de aldrabões que, pela terceira vez após o "25/04", atiraram este País para, de mão estendida, hipotecar a sua soberania aos interesses estrangeiros. Eduardo Catroga faz-me lembrar aquela casta de políticos que, em nome do Estado negociaram determinado contrato ou concessão e, depois do mesmo assinado e com a tinta acabada de secar, passaram-se para o outro lado. Sãos os Ferreiras do Amaral, os Pinas de Moura deste País, entre outros. O sentido Pátrio desapareceu. Tudo em nome da voragem de altos vencimentos. Alguém lhes diga que, quando morrerem, não poderão levar a fortuna consigo.   


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A Presidente da Libéria, que foi galardoada com o Prémio Nobel da Paz, pela sua luta em prol dos direitos das mulheres, defendeu a criminalização do homossexualismo. Não sei porquê deu-me uma vontade de lhe oferecer o "De profundis" de Oscar Wilde. Mas não, devo ser eu que estou a delirar e li mal a notícia.


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Nalgumas escolas próximas de Dodoma, capital da Tanzânia, as crianças portadoras do virus HIV têm que usar, obrigatoriamente, um laço vermelho na lapela do uniforme. Não sei porquê lembrei-me de estrelas amarelas, nazis, etc. e tal. Mas não, devo ser eu que estou a delirar e li mal a notícia.


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Está a acontecer



Exposição subordinada ao tema  "Guerra colonial /Tarrafal / 50 anos depois". A nossa memória colectiva revisitada em textos, fotos e mapas afixados em paineis, numa exposição coordenada pelo jornalista, escritoe e historiador António Valdemar e concepção gráfica do cenógrafo e artista plástico Fernando Filipe. A decorrer até 30 de Abril próximo, na Sociedade Portuguesa de Autores (Rua Gonçalves Crespo - 62 - Lisboa).


Festival de Gastronomia Serrana, no concelho de Tavira. A comida confeccionada aos poucos e saboreada do mesmo modo. O conceito do "slow food". Até 15 de Abril próximo.


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Vai acontecer


Na Biblioteca Museu da República e Resistência (Lisboa) exibição do filme "Os miseráveis". No próximo dia 28 de Março, pelas 18H00. Entrada livre.



Na Biblioteca Municipal da Penha de França (Lisboa) leitura e discussão da obra "Memória de elefante", de António Lobo Antunes. No próximo dia 28 de Março, pelas 11H00. Entrada livre, mediante inscrição prévia.



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Defenda a sua língua materna. Recuse-se a escrever com as normas do actual Acordo Ortográfico.


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Todas as marcas ou produtos referidos no presente texto são incompatíveis com intuitos publicitários. As referências aos mesmos reflectem, apenas, a opinião do Autor e nada mais do que isso.


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quarta-feira, 21 de março de 2012

Delia Julia Denning Akeley

Viajantes, aventureiros e exploradores



Delia Julia Denning Akeley - Winsconsin (EUA), 05/12/1875 - Daytona (EUA), 1970. Exploradora, caçadora e etnógrafa. Filha de emigrantes irlandeses, cansada da rudeza da vida familiar que levava, sendo a mais nova de oito irmãos, foge de casa aos treze anos de idade cortando, até ao fim da sua vida, com os laços familiares.

Em Milwaukee, onde chega em fuga, trava-se de conhecimento com Artur Reiss, com quem acaba por casar, uma casamento mais de necessidade e de circunstância do que de amor. É aqui que acaba por travar conhecimento com Carl E. Akeley, um caçador, taxidermista e escultor, e que foi o grande amor da sua vida, pelo que logo Artur Reiss passou à história, como um pequeno precalço da sua vida.

Casa-se, em 1902, com Carl E. Akeley que, ao serviço do Museu de História Natural de Chicago, efectuava safaris africanos para melhor recriar o salão africano daquele museu, safaris estes que se efectuaram em 1905 e 1909.

Para Delia Akeley esta primeira ida a África, em 1905, foi um descobrir dum novo e maravilhoso mundo que a irá acompanhar até ao fim dos seus dias. Durante dezoito meses, tempo que durou o primeiro safari, Delia Akeley aperfeiçoa os seus dotes de caçadora de caça grossa e, da sua conta pessoal, são enviados para o museu de Chicago, dois elefantes e um búfalo.

Em 1909, agora ao serviço do Museu de História Natural de Nova Iorque (NY) regressam ao Quénia para caçarem mais exemplares para o museu nova-iorquino. Esta expedição durará dois anos, e parte dela, contará com a presença de Teodore Roosevelt, Presidente dos EUA que se desloca a caçar ao Quénia e onde também abate dois elefantes que ofertará ao Museu Nacional de Washington.


Delia Akeley salvou a vida ao marido quando ele, certa vez e sem a sua companhia, se ausentou para localizar uma manada de elefantes e acabou gravemente ferido perante a investida dum paquiderme que o projectou pelo ar. Três dias depois deste evento é que Delia Akeley toma conhecimento dos factos, por carregadores que entretanto chegaram ao acampamento, e que tinham fugido da investida do elefante e abandonado Carl Akeley à sua sorte, convictos que ele estava morto e, surpesticiosos com eram, não tocavam em mortos. Decidida a localizá-lo consegue persuadir alguns carregadores a acompanhá-la, na busca do marido no meio da selva. Demorou dias a localizar o rasto do marido e à noite tinha que amarrar os carregadores, para estes não lhe fugirem com medo dalguma fera ou do frio. Finalmente, já desesperada, teve a sorte de o encontrar depois de disparar tiros de alerta, ao que este respondeu. Carl Akeley tinha perfuração pulmonar, traumatismo craniano e algumas costelas partidas e, mesmo assim, sobrevivera à sede e à fome, sozinho na selva.

Nesta segunda expedição a África, nativos capturam para Delia Akeley um macaco, que ela apelida de "JT", e a quem se afeiçoa como um animal de estimação a quem permitia todas as tropelias. Trá-lo para Nova Iorque, estudando o seu comportamento. Durante nove anos conviveu com este macaco, que estudou ao pormenor até que acabou por ter que o entregar ao Jardim Zoológico face aos seus comportamentos agressivos. Desta situação nascerá um livro da sua autoria: "JT the biography of an african monkey" (1928), onde  defendia que os primatas podiam comunicar com os humanos e tinham um linguarejar próprio.

Cansada de viver à sombra do marido e estando este envolvido  emocionalmente com outra pessoa, a exploradora Mary Jobe com quem virá posteriormente a casar, o casal consuma o divórcio em 1923. Três anos mais tarde Carl Akeley morrerá, numa outra expedição africana, de pneumonia, quando visitava o santuário dos gorilas nos montes Virunga. Já não tinha Delia ao pé de si para o salvar. 

Após o divórcio Delia Akeley viaja muito por África, centrando as suas atenções mais em estudos etnográficos de povos primitivos. Era uma caçadora de caça grossa experiente e uma atiradora de elite. Viveu na selva com pigmeus e estava preparada para uma morte rápida. Levava sempre consigo uma maneira rápida de acabar com a vida. Como ela disse, certa vez, numa entrevista: "Sinto sempre medo da selva e estou preparada para uma morte violenta. Nunca viajo sem levar comigo os meios mais adequados para acabar rapidamente com a minha vida se receber alguma ferida mortal. Mas este tipo de vida selvagem encanta-me."

Após a morte de Carl Akeley o Museu de História Natural de Nova Iorque contrata Mary Jobe para dar continuidade ao trabalho do falecido, o que Delia Akeley considera uma afronta a tudo o que ela labutara anteriormente para o referido museu. A somar a isso o facto do falecido ter declarado a sua segunda esposa como sua herdeira universal, relegando Delia Akeley como se nunca tivesse contribuído com nada para o seu património ainda mais a magoou.

Aos 49 anos de idade (1924), já era uma africanista experiente e conceituada, atravessou África de costa a costa, partindo do Quénia, atravessando o Uganda e atingindo o Oceano Atlântico no Congo Belga. Expedicionara sózinha, sem recurso a caçadores europeus ou guias e ao serviço do Museu de Artes e Ciências de Brooklin (NY), que a contratara para capturar exemplares da fauna africana e efectuar estudos etnográficos de tribos primitvas. Como ela própria referiu, depois: "Desde a minha primeira experiência com tribos primitivas da África Central, há já vinte e dois anos, fiquei com a firme convicção de que se uma mulher se aventurasse sozinha, sem escolta armada, e vivesse nas aldeias, conseguiria estabelecer amizade com as mulheres e obter informações muito valiosas e verdadeiras sobre os seus costumes tribais."

Chegada a Mombaça organiza uma expedição contratando carregadores e adquirindo animais de carga. Atravessa o Quénia e atinge o rio Tana, que atravessa de canoa durante dez semanas, explorando e fotografando o mesmo até atingir o posto britânico de San Kuri, onde repousa. Dirige-se para a Etiópia, atravessando o deserto somáli de camelo, numa viagem em que, naquela época, poucos europeus (todos homens) se tinham aventurado a tal. Demorou três meses a atingir o posto militar de Muddo Gashi, na Somália perante a incredulidade dos soldados aí de serviço, custando-lhes a crer que uma mulher, única pessoa europeia duma expedição, tivesse logrado tal façanha. Retorna ao Quénia, até Nairobi, onde embarca para os Estados Unidos toda a colecção de animais mortos e por si embalsamados na expedição. Dirás, desta aventura, mais tarde: " Fiz a primeira parte da minha viagem de canoa, subindo o rio Tana e viajando terra adentro a partir do Oceano Índico. Cacei no capim e ao longo da margem, à procura de elefantes e de antílopes, conservando e secando eu própria as peles. Tirei muitas fotografias e revelei os negativos conforme pude. Comprei camelos aos somalis, uma tribo nómada e pouco amistosa, e continuei a atravessar a terra árida do deserto entre i rio Tana e a Abissínia, avançando sempre à luz da lua para evitar morrer de insolação."


Deixa-se ficar no Quénia, até que decide ir viver com uma tribo o mais primitiva possível para estudá-la. Opta em deslocar-se para o Congo Belga, terra de feiticeiros e canibais, de selvas impenetráveis e com extensas áreas onde os europeus não tinham penetrado. Em Março de 1925 navega pelo rio Epulu e penetra numa selva africana diferente de todas aquelas que tinha conhecido até então. Muito mais fechada, densa e húmida, onde os próprios nativos eram muito mais violentos e pouco amistosos para consigo, fruto da sua condição de branca. Para muitos deles a pele branca significava escravidão, chicote e fome. 

Fixa-se durante meses na zona dos rios Ituri e Aluwini, onde viviam os mbuti , tribo de pigmeus em estado primitivo e sem qualquer contacto com europeus. Delia Akeley vive como um deles, estudando-os ao pormenor e fixará em centenas de fotografias a sua vivência no meio daquela tribo e da selva. Com as pigmeias vai à colecta do mel e frutos e com os pigmeus vai à caça do elefante. Meses depois está completamente esgotada e saturada, pelo que resolve terminar ali a sua estadia no meio dos pigmeus.

Parte para a remota aldeia de Niangara, na margem do rio Uela, no norte do Congo belga perto da fronteira sudanesa. Vai a caçar em Bafuka e convive com canibais, só se apercebendo disso quando servem carne humana à refeição: "O sultão enviou uma caçarola com comida para os meus criados e quando me aproximei com a lanterna para ver o que era descobri um antebraço bem cozido. Como os nativos da selva comem habitualmente macaco, achei que iam fazer um festim. Mas, para meu horror, o pedaço seguinte que descobri foi uma mão de bom tamanho que pertencia evidentemente a um ser humano. Fiquei bastante doente e o pior é que descobri que os meus dois criados de confiança eram canibais." Acaba por adoecer de malária, em Bafuka, caindo à cama e recordará, mais tarde: "Quando não estava a delirar conseguia ouvir o cozinheiro e o meu criado a discutir como deveriam preparar o meu corpo quando morresse e como iriam repartir os meus pertences. Todas as manhãs um deles entrava na minha tenda e perguntava-me educadamente se pensava morrer nesse dia." Quando recupera abandona aquela zona e dirige-se para Stanleyville e daí, navega pelo Congo até Leopoldville e de comboio até Boma, que atinge em Setembro de 1925.


Retorna a Nova Iorque onde a sua fama a precede. Em 1929 volta a África, para dar continuidade aos seus trabalhos sobre os pigmeus, sendo esta a sua última viagem a este continente. Arranca de Cartum, no Sudão, navega pelo rio Nilo e entra no Congo Belga, instalando-se nas margens do rio Ituri, em Avabuki. Durante cinco meses roda milhares de metros de filmes e de fotografias sobre pigmeus, e recolhe todo o tipo de instrumentos de arte, de artesanato, de caça, de ornamentos e de utensílios domésticos que pode, rodeando-se dum verdadeiro espólio etnográfico. Delia Akeley tinha a perfeita consciência que estava a registar os últimos sobreviventes da verdadeira e velha África antes de serem totalmente colonizados pelos europeus.

De regresso aos Estados Unidos centra-se em conferências científicas por todo o país e a escrever o seu livro "Among the pigmies in the Congo forest". Volta a casar-se com um antigo amigo seu, abandonando de vez a vida aventureira, indo viver esta nova fase da sua vida em Vermont. Tendo enviuvado em 1951, muda-se para Daytona, até que a morte a colhe aos 95 anos.

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Nota: As transcrições do discurso directo foram retiradas do livro "Memórias de África", de Cristina Morató, já  anteriormente referido.



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Historiando Moçambique Colonial

Abada - 1) Rinoceronte; 2) Nome que se dá ao chifre de rinoceronte e que, segundo convicção popular bastante disseminada em diversas partes do mundo, produz efeitos afrodisíacos quando reduzido a pó. Por outro lado, estes chifres, quando trabalhados num torno por artesãos, tornam-se taças translúcidas, provocando alterações de tonalidade que podem, em teoria, revelar a presença de veneno em bebidas. Assim, a busca do seu chifre, que ainda é muito frequente nos dias de hoje, quase que levou à sua extinção. A crença do seu poder afrodisíaco não tem, na ciência, qualquer fundamento.

Amanbo - Chefe territorial, súbdito dum Régulo, que desempenhava também a dupla função religiosa de manter os costumes ancestrais do seu povo e de servir de elo de ligação com os actos sobrenaturais.

Âmbar - É um produto que pode ser obtido por duas vias: vegetal e animal. No campo vegetal é uma resina fóssil, proveniente dum pinheiro existente na Europa e que era utilizado com fins medicinais, sendo conhecido por âmbar amarelo. No outro campo, há o âmbar pardo ou cinzento, sendo extraído do intestino dos cetáceos (baleias e cachalotes), tornando-se uma espécie de cera dura. Abundando no Oceano Índico, era utilizado para diversos fins, tais como o farmacêutico, de adorno, de feitiçaria e de perfumaria. Era um produto que tinha bastante procura em Moçambique sendo, no século XVI, monopólio dos capitães de Sofala e ilha de Moçambique.

Ankhoswe - Guardião da sucessão dinástica do povo Chewa, do tipo matrilinear, função que acumulava com a de conselheiro real. Podia, ainda, exercer o cargo de chefe territorial.

Argentina - Nome que inicialmente era conhecido o pequeno Reino de Chicova, devido à forte presunção inicial do mesmo ser rico em prata.


Caçadores das terras - Forças irregulares nativas, fornecidas pelos régulos avassalados, quando convocados para tal. Podiam ter funções policiais ou guerreiras, numa determinada região e eram, quase sempre, pagas pelo direito de saque.


Caçadores de carne - Designação referente aos caçadores que eram contratados para abastecerem de carne de caça diversas empresas, públicas ou privadas, que laborassem no interior do território.


Cafraria - Terra dos cafres; África.


Cafre - Aportuguesamento da palavra árabe "kafir", que significa "infiel" (no sentido religioso, por não seguir os ensinamentos do Alcorão). Era deste modo que os árabes se referiam aos africanos que não professassem a religão muçulmana. Utilizada em sentido depreciativo, queria significar pessoa rude, do tipo bárbaro e, como tal, de capacidade intelectual limitada e de pouca ou nenhuma confiança. O sentido de superioridade rácica que prevaleceu nos povos colonizadores levou-os a generalizar este termo para qualquer tipo de africano.


Costa da Crafraria - Era a denominação inicial que os portugueses, nos primórdios das suas viagens marítimas, se referiam à costa africana e que abrangia desde o cabo das Agulhas à baía de Lourenço Marques.


(Frei) João dos Santos - (Évora, 1560/70(?) - Goa, 1622/25 (?)) - Sacerdote dominicano. Tendo tomado as ordens religiosas em 1584, como frade das Ordem dos Pregadores embarca, dois anos depois, para Moçambique estabelecendo-se em Sofala, até 1591. De seguida vai para Tete e, no ano seguinte, é colocado nas Quirimbas, local onde exerceu o sacerdócio até 1594. No ano seguinte ruma para Goa, onde se fixa durante cinco anos, após o que regressa a Portugal. Em 1608 publica o seu livro "Ethiopia Oriental e vária História de cousas notáveis do Oriente", que é um notável acervo dos conhecimentos de geografia, antropologia, flora e fauna que adquiriu ao longo da sua estadia africana e indiana. Em 1610 ou 1611 regressa a Moçambique e, após uma tentativa frustada de se estabelecer na corte do Monomotapa Gatsi Rucere, foi requisitado por Diogo Simões Madeira(*) para se estabelecer na área de Chicova, afim de exercer o seu apostolado, o que vem a suceder. Desta sua estadia resulta a "Relação do descobrimento das minas de prata de Xicova", saído à estampa em 1618, bem como ficou inédito um manuscrito intitulado "Comentário da região dos Rios de Cuama". Retorna a Goa, onde virá a falecer.


Presídio - Nome dado a uma oferta anual (e que depois passou a trienal) que os portugueses entregavam ao Monomotapa, como forma de testemunho de agradecimento pelos tratados de amizade e aliança que se firmavam. O presídio era pago em fazendas diversificadas e quinquilharias variadas e teve uma duração de cerca de 300 anos, até ser extinto em princípios do século XVIII.

Reino de Chicova - Pequeno Reino que se situava na zona de Tete, a Sul do rio Zambeze e que estava avassalado ao Reino do Monomotapa. A existência  de minas de prata nos seus territórios despertou o interesse e a consequente instalação dos portugueses. No ano de 1572 Francisco Barreto (**), no decurso da sua expedição militar ao Monomotapa, deixou uma guarnição de cerca de 200 homens, com a missão de conseguirem determinar onde se situavam as muito faladas minas de prata de Chicova. Esta guarnição acabou por ser chacinada pelas populações locais, cansadas de serem permanentemente espoliadas dos seus bens pelos invasores portugueses. Em 1614 Diogo Simões Madeira (*) mandou construir o forte de S. Miguel, mas as minas de Chicova nunca passaram de uma lenda. Foi em Chicova que se deu o massacre que vitimou o Governador Vilas-Boas Truão (*), em 1807.


Suhaíli - Palavra de origem árabe que significa "costa", "litoral" e, por extensão, "povo que vive no litoral". Com a chegada dos mercadores ao litoral de África e com a sua instalação nessas áreas, com o decorrer dos tempos acabaram por se misturar com os autóctenes, quer pela via do casamento, quer pela via do interesse comercial ou pela via do factor religioso. Assim, da fusão de africanos e árabes nasceu uma cultura cruzada em múltiplos campos, que vem dar origem a um novo grupo étnico, os suhaílis, os quais se estendiam em toda a costa oriental africana até ao centro litoral moçambicano. Em Moçambique deu-se, no litoral norte, este secular cruzamento biológico e cultural entre árabes escravocratas com mulheres macuas, pelo que os suahílis estendiam-se, ao longo da faixa litoral, desde o Rovuma até ao centro. 


Sultanato de Angoche - Este Sultanato terá sido fundado já no decorrer da segunda metade do século XV, por Mussa, alto dignitário de Quíloa que, tendo fugido de lá, juntamente com Husseine, rumaram para o litoral Sul, em busca de segurança. Tendo Husseine falecido, Mussa enterrou-o na foz do Angoche e, antes de se retirar para a ilha de Moçambique entronizou Xosa, filho de Husseine, como Sultão de Angoche. Foi o filho deste que deu continuidade à linhagem nobre do Sultanato. Esta feitoria afro-árabe serviu de escoamento aos produtos árabes vindos de Sofala quando os portugueses, ao instalarem-se ali, começaram a estrangular o comércio arabizado. Em 1511, como forma de tentarem acabar com essa via de escoamento dos produtos árabes e bem assim de se libertarem do estrangulamento que Angoche estava a praticar sobre a ilha de Moçambique, os portugueses atacaram Angoche e arrasaram-na, mas não deixaram nenhuma guarnição, o que permitiu ao Sultanato erguer-se das cinzas e revitalizar-se. No entanto o domínio que os portugueses começaram a estabelecer no vale do Zambeze, levou ao declínio de Angoche, devido à diminuição do volume de mercadorias vinda do interior, para exportação. Em princípios do século XVII o Sultanato estava comercialmente arruinado, tendo apenas uma economia de sobrevivência. Tendo sido conquistado pelos maraves do Karonga (1) Muzura, a sua actividade comercial resumia-se a conchas e missangas, marfim, âmbar e, principalmente, escravos. Após a dissolução da influência marave, o Sultanato readquiriu a sua independência. No século XVIII o seu comércio era quase nulo e Angoche sobrevivia num autêntico marasmo. Por volta de 1730 a povoação é assaltada e saqueada e o Sultão assassinado, vivendo o seu herdeiro em Mombaça pelo que, em 1755, os portugueses colaboram na sua restauração, reiniciando também um incipiente comércio com a ilha de Moçambique. Em finais deste século deu-se um surto de deslocação populacional dos imbamelas para a sua área, pelo que o Sultanato, com receio de perder o domínio dos portos, negociou a fixação dos mesmos entre Angoche e Sangage. O Sultano ressurge economicamente em meados do século XIX, graças ao incremento e desenvolvimento do tráfico esclavagista. Do seu porto exportavam-se escravos não só para Zanzibar, Comores e Madagáscar, como também para o Brasil. Em 1847 o Sultão de Angoche cortou decapitou três emissários do Governador da ilha de Moçambique, que ali os tinha enviado para exigir vassalagem. Hassane-Issufo (*) ascende ao poder do Sultanato em 1849 e passa-o para o seu irmão Mussa-Quanto quando o prazeiro João Bonifácio Alves da Silva (*) invade as suas terras, em 1861. Após o falecimento de Mussa-Quanto (*) perfilaram-se vários pretendentes ao poder do mesmo, acabando por ascender Ussene Ibrahimo (*). Após a morte deste é Farelay (*) quem passa a dirigir os destinos do Sultanato. Em finais do século XIX o Sultanato entrou em derrapagem económica, por a ilha de Madagáscar, que era o seu principal sustentáculo financeiro, ter caído soba  alçada do domínio colonial francês. No entanto, até finais da primeira década do século XX este Sultanato guerreará sempre os portugueses, até ter claudicado de vez.

(1) - Título dinástico marave.
(*) - A ser biografado posteriormente.
(**) - Já biografado.


Terras do Bororo - Zona geográfica indefinida na sua extensão, mas que os portugueses se referiam, no século XVI, às áreas a Norte do rio Zambeze, entre o Chire a a costa.


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Livro

A 25 de Abril de 1560 sai, de Lisboa com destino à Índia, uma armada de seis naus, na qual se integrava a "São Paulo" que era capitaneada por Rui de Melo Câmara. Era uma nau comercial de 500 toneis de arqueação e transportava 520 pessoas, no total. Em Maio, navegando por zona das Canárias, são surpreendidos por ventos Este, com cerca de 100 quilómetros/hora de velocidade e têm a primeira vítima, que foi um marujo que estava no cesto da gávea. A tempestade que sofrem era tão forte que quase atira com os navios para as costas marroquinas, acabando a mesma dispersa. Em finais desse mês de Maio estão nas costas da Guiné, onde a "São Paulo" fica meses a navegar em alto mar praticamente parada, por falta de vento. O excesso de calor, a humidade excessiva e a queda violenta e abrupta de chuvadas, a falta de alimentação adequada, tudo se conjuga para adoecerem cerca de 300 pessoas, para as quais só o sangramento e a toma de purgantes e xaropes são as únicas panaceias. Em finais de Julho atravessam a linha do equador e passam pelas ilhas da Trindade, de Ascensão e Tristão da Cunha.

Por esta altura, o piloto António Dias, desce para uma latitude Sul muito alta (40º) e flecte o navio para Oriente, informando quem o questiona que, quando tivesse atingido a latitude de Ceilão, rumaria então para Norte. Só que, por erro de cálculo, flecte a nau um pouco para Leste e o resultado é que, a 20 de Janeiro de 1561 estão perto do cabo Camorim, avistam bambus e vegetação à tona da água que nada tem a ver com a flora indiana e apercebem-se de dezenas de ilhas e ilhotas desconhecidas, até que são apanhados por uma tempestade que lhes quebra os mastros.

Durante a noite o navio, já sem velas, anda à deriva até que ao nascer do dia encalha num baixio e já dali não sai. Há quem salte do navio para, a nado, atingir um ilha e acaba morto ou ferido contra os corais. Decidem descer um esquife (1) da "São Paulo" e, durante todo esse dia (22/01/1560) após vária idas e vindas entre a nau e uma ilha, desembarcam todos os 330 náufragos sobreviventes, até ao cair da noite. Estão sem comida e água e, quando nasce o dia, alguns sobreviventes começam a saquear os bens dos mortos, um costume da época.  Estavam em Sumatra, mais concretamente no cinturão de ilhas que envolvem a costa Oeste desta, nas que são hoje as ilhas Malami, Siberute e Sitora. Naquela época Sumatra fazia parte do sultanato de Achém, liderada por Aladim-al-Sakar, inimigo dos portugueses desde que Afonso de Albuquerque conquistara Malaca (1513), criando uma feitoria que lhes fazia frente comercial.

Começa a desenhar-se a desunião entre os náufragos, quando alguns destes acusam os oficiais, os ricos mercadores e os padres de tentarem fugir no esquife, abandonando os outros ali. Pensam matarem as mulheres e as crianças, para terem menos bocas a alimentar e menos corpos para salvarem. Por fim dois padres jesuítas que estavam entre eles, Manuel Álvares e João Roxo, conseguem reunificar os desavindos e todos reconhecem no Capitão do navio o seu Capitão em terra, reconhecendo-lhe autoridade total.

Ficam ali estabelecidos, não faltando alimento dos recursos  naturais (peixe, palmitos, cocos, etc.) até que em finais de Fevereiro (1561) avistam um bateis malaios e dois dos náufragos, que tinham ido à busca de alimentos, são encontrados mortos e parcialmente canibalizados. Tinham entretanto construído uma barca com remos e vela, com madeirame da "São Paulo" e recuperado o esquife e, em meados de Março, preparavam-se todos para partir quando o Capitão ordena o embarque apenas das mulheres, dos seus amigos, de homens ricos e dos oficiais, deixando em terra 170 homens entregues ao seu destino. Não havia espaço para todos, porque parte do navio fora preenchida com bens materiais dos homens ricos e com a construção duma casa de banho e quarto para as mulheres, que acabaram por tirar espaço e capacidade de carga.

Dos abandonados em terra cerca de 80 atiram-se a nado para os navios, na tentativa de os escalarem, mas são repelidos na ponta das espadas e lanças dos que lá se encontram. Aos que ficam em terra é-lhes recusado qualquer tipo de armamento para se defenderem bem como é recusado o embarque a crianças doentes. Não havia lugar a humanitarismos. É-lhes ordenado pelo Capitão que caminhem nove léguas para Sul, até uma enseada, onde serão então recolhidos. Atingida esta enseada ordenam-lhes, por um batel que vem a terra, que caminhem mais 30 léguas para Sul, para outra enseada, enquanto o navio navega à costa na mesma direcção.

É quando avistam uma pequena flotilha de juncos pirata malaios, que o barco português os combate  e leva-os de vencida graças à artilharia que tinham retirado da "São Paulo". Finalmente, com os juncos malaios apresados, já têm navios para embarcarem os que  estavam em terra. Como acto de vingança, pelo portugueses mortos no combate, decapitam os prisioneiros malaios excepto o piloto que os leva para o Sul de Sumatra, até à foz do rio Menencabo, na ilha de Mitau, onde são bem recebidos pelos gentios. A maior parte dos portugueses fica em terra a descansar, até que são atacados pelos malaios que liquidam 60 deles, conseguindo os restantes fugirem de novo para os navios. Depois de dias de provações atingem  o estreito de Bunda, onde são casualmente encontrados por navios portugueses que por ali passavam e os salvam. 


(1) - pequeno barco de apoio.

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Ora é sobre esta história da viagem e naufrágio da nau "São Paulo" e das peripécias dos seus sobreviventes que se narra no romance histórico "Malabar", autoria de Mário de Sousa Cunha (Bertrand Editora, 2008, 538 págs.), romance que, com agrado, li esta semana.



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Sobre a fonte histórica deste naufrágio pode-se ler o relato do mesmo através do testemunho escrito dum seu participante, de seu nome Henrique Dias em "Relação da viagem e naufrágio da nau São Paulo", (Volume I - Págs. 446/470) e que foi editado em dois volumes por Bernardo Gomes de Brito em "História Trágico-Marítima", entre 1735/36.  
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Poesia



Sobre a temática dos naufrágios transcreve-se um soneto de Camilo Castelo Branco:


Senhor! Vós que soprais a tempestade,
cavando abismos sobre o mar irado,
ouvide os roucos sons do afogado,
que geme nos umbrais da eternidade!


Nesses transes cruéis d´ansiedade,
rolando contra a rocha espedaçado,
a prece, que murmura o desgraçado,
é grito de perdão!... meu Deus! - piedade!


Perdoai-lhe, Senhor! ouvi, piedoso,
o brado d´aflição, que manda aos céus,
o filho, o amigo, o irmão mais caridoso!


Ouviu-lhe o seu clamor entre escarcéus;
pois, naquele morrer angustioso
bradou-lhe o coração - "Perdão, meu Deus!"

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Hoje (21/03/2012) assinala-se o Dia Mundial da Poesia. Muito justamente considerada como sendo o domínio da nobre arte da palavra, em homenagem do dia de hoje transcrevo, de memória (desde já me penitenciando dalgum lapso) o primeiro poema sobre o qual verdadeiramente me debrucei, nos meus idos tempos do liceu, era eu um rapazote. Ainda hoje, meio século volvido, esse poema baila na minha memória. Trata-se duma cantiga de amigo, da autoria do trovador medieval Estevão Pais Coelho e reza deste modo:


Sedia la fermosa seu sirgo torcendo
Sa vox manselinha fermoso dizendo
Cantigas d´amigo.


Sedia la fermosa seu sirgo laurado
Sa vox manselinha fermoso cantando
canbtigas d´amado.


Par Deus de Cruz, Senhora,
que d´amor mui haveis sofrido
que tam bem cantades
cantigas d´amigo.


Par Deus de Crus, Senhora,
que d´amoe mui haveis laurado
que tam bem cantedes
cantigas d´amado


Ayutre comesteis, que haveis advinhado!  


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Música


Robert Johnson - (1911 - 1938) - Compositor e cantor de blues rurais, do delta do Missipi. Nascido no seio da mais baixa escala da miséria humana, tem uma infância infeliz e violenta onde, inclusivamente, vê a sua mãe a fugir dum linchamento, naqueles duros tempos rácicos do Missipi. Apenas com  estudos rudimentares, cresce ao abandono, já que a sua mãe, na luta pela sobrevivência e com onze filhos, quase que se dedica apenas aos múltiplos amantes. Aprende a tocar harmónica e, depois, guitarra ao ver Son House e Charley Patton a tocarem este instrumento.


Cria o estilo de tocar viola com um gargalo de garrafa do dedo mindinho, o "bottleneck", desenvolvendo uma sonoridade metálica, tipo havaiano. As suas letras são o reflexo da vida errante que leva, que abarcam os amores passageiros, a solidão, a saudade da terra. Compôs 32 canções e nunca teve direitos de autor. Morreu jovem, eventualmente envenenado por um marido ciumento. Hoje é considerado uma lenda e inspirador de muitos músicos do panorama do rock´n roll.






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Filme

Inspirado na personagem de Robert Johnson, em 1896 Walter Hill realizou o filme "A encruzilhada", no qual um jovem (Ralph Machio) ajuda a fugir dum asilo de idosos um velho "bluesman" (Joe Seneca) e ambos partem para o Missipi, em busca duma lendária canção nunca editada de Robert Johnson. No entanto o destino leva-os a uma encruzilhada, local de eleição do Diabo para capturar futuras almas em troca duma vida terrena gloriosa e, aí, o jovem vê-se envolvido num (brilhante) duelo de guitarras com um guitarrista do Diabo, que acaba por  vencer e assim, resgatar a alma do velho que o acompanhava. Um filme singelo, mas um reconhecimento à importância dos blues do Missipi, que neste filme têm a sonoridade electrizante de Ry Cooder. A ver, numa soalheira tarde domingueira ou no esplendor duma noite de calor.







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Defenda a sua língua materna. Recuse-se a escrever com as normas do actual Acordo Ortográfico.


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Todas as marcas ou produtos referidos no presente texto são incompatíveis com intuitos publicitários. As referências aos mesmos reflectem, apenas, a opinião do Autor e nada mais do que isso.


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terça-feira, 13 de março de 2012

Bartolomeu Dias

Viajantes, aventureiros e exploradores


Bartolomeu Dias - (?/Atlântico Sul, 1500) - Navegador. Sendo desconhecida a sua data e local de nascimento, sabe-se que o mesmo era escudeiro real. A existência de vários homónimos seus contemporâneos obrigou eméritos historiadores a destrinçarem os factos que, historicamente, se podem atribuir sem dúvidas a este navegador.

A real política joanina da época centrava-se num objectivo: o atingimento da Índia contornando a costa do continente africano, pelos mares do Sul e, em simultâneo, a recolha de informes sobre a terra das especiarias, pelos caminhos do Oriente.

Se para Oriente foram enviados uns quantos espiões, nos quais se elevou o grande Pêro da Covilhã, "primus inter pares"; já para os mares meridionais, depois de sistematizadas as navegações, avultou a figura de Bartolomeu Dias que viria da dobrar o baptizado Cabo das Tormentas e rebaptizado Cabo da Boa Esperança.

Feito Capitão-Mor, por nomeação real, Bartolomeu Dias lidera uma expedição marítima de três navios que, em Agosto de 1487 sai de Lisboa rumando para o Sul da costa africana. Das três caravelas, comanda directamente uma, sendo as outras entregues ao seu irmão Diogo Dias e a João Infante. Tendo atingido a Serra Parda, onde findara o descobrimento anterior de Diogo Cão, navega à vista da linha da costa,  até atingir o Cabo das Voltas, em data incerta e, logo de seguida, a Angra das Voltas, assim apelidada pelo constante bolinar das naus, ou seja "pelas muitas voltas em que então ali andaram" (João de Barros, Ásia"); 

Deixando um dos três navios com alguns tripulantes, liderados pelo seu irmão Diogo Dias, na costa namibiana a fim destes tratarem de se reabastecerem de provisões que melhor aconchegassem os restantes aquando do seu regresso segue sempre na derrota para Sul acompanhado pelo navio capitaneado por João Infante.

A 26 de Dezembro atinge o Golfo de Santo Estevão; na dobragem do novo ano avista a Terra de São Silvestre e seis dias após o nascimento do novo ano atinge a serra dos Reis; após o que apanha ventos suestes que obrigam ao abandono da navegação à vista da costa durante dias, sempre para sul. Quando atinge a latitude dos ventos Oeste (35º a 40º Sul) e apanhando mares "já muito frios" (João de Barros, "Ásia") os navegantes flectem para Leste e, perante a ausência de terra que não logravam ver, Bartolomeu Dias ruma para Norte. Tinha ultrapassado o extremo meridional africano e rumavam agora no Oceano Índico, até que lograram avistar costa, a Angra de São Braz, a 03 de Fevereiro de 1488 e aguam na angra dos Vaqueiros. Prosseguindo a viagem na rota índica aporta na zona do rio Infante (Great Fish River), assim apelidado por ter sido o navio capitaneado por João Infante o primeiro a tê-lo atingido.

Acabando por ceder às pretensões de grande parte da sua tripulação que, cansada da viagem e com parcos meios para navegarem em mares desconhecidos, requer o regresso ao Reino. Efectua a torna-viagem, explorando agora os cabos das Agulhas e das Tormentas, acabando por chegar à barra de Lisboa num incerto dia de Dezembro de 1488.

Esta decisão de regressar ao Reino acabará por lhe cercear, no futuro, a nomeação para liderar outras viagens exploratórias, pois Dom João II não lhe perdoará a tibieza com que defrontou o motim da tripulação. O monarca tivera a percepção que se perdera ali, nas costa meridionais índicas, a rara ocasião de se ter antecipado o relógio da História. Um dos factos desta amargura real prende-se com o facto de, por exemplo, Bartolomeu Dias não ter sido feito nobre, contrariamente a que sucedera com Diogo Cão.

Na sucessão real, o novo Rei (D.Manuel I) acompanhará o pensar do seu antecessor e Bartolomeu Dias não é escolhido para liderar ou mesmo participar na armada que rasgará o véu do desconhecimento dos mares índicos; sendo o comando da mesma entregue a Vasco da Gama.

Após ter cumprido a viagem da sua vida, continua ligado à marinha sem grandes aparatos, para além de ter exercido o cargo de recebedor do Armazém da Guiné, entre 1494 e 1497 até que, em 1500, capitaneando uma nau integrada na Armada de Pedro Álvares Cabral, após o achamento do Brasil, Bartolomeu Dias cumpre a viagem da sua morte ao acompanhar o destino do seu navio num naufrágio que os apanha no Atlântico Sul.  

Postumamente o Rei D. Manuel I, a 02 de Julho de 1501, publica um alvará no qual, atendendo ao facto de ter morrido ao serviço da Coroa e, sem sequer aludir à sua descoberta da dobragem do Cabo da Boa Esperança, perdoa-lhe algumas verbas que estaria em dívida quando exercera o cargo de recebedor do Armazém da Guiné (que exerceu entre 1494 e 1497), dizendo: "... a quantos esta nossa carta de quitação virem, fazemos saber que pela arrecadação da conta que foi tomada a Bartolomeu Dias, escudeiro da nossa Casa e recebedor que foi do Armazém da Guiné nos anos de 1494, 1495, 1496 e parte do ano de 1497 se mostra receber de dinheiro doze contos novecentos e noventa e dois mil e dois reais, e muitas artilharias, pólvora, navios, cordoalha, enxárcia, velas, mastros, vergas e outras muitas coisas necessárias para despesas e maneio da dita casa, as quais aqui se não declaram para escusar larga leitura; do qual dinheiro e coisas, posto que pelo encerramento da dita arrecadação se mostre algumas delas ficar devendo a nós, por o dito Bartolomeu Dias falecer em nosso serviço na viagem da Índia, onde o enviámos

Na magnanimidade real prevalecera a sua morte em serviço, em detrimento do feito maior que fora a dobragem do Cabo Tormentoso.

Historiando Moçambique Colonial

Paiva de Andrada - (Lisboa, 1846 - Paris, 1928 - Joaquim Carlos Paiva de Andrada) - Explorador e Oficial do Exército Português (Coronel). Explorador de grande mérito é considerado, à escala lusitana, o "Cecil Rhodes português". Tendo concluído o curso de Oficial de Artilharia em 1867 é nomeado, dez anos mais tarde, adido militar em Paris, tendo assistido à guerra franco-prussiana. No ano seguinte (1878) cria a Sociedade dos Fundadores da Companhia Geral do Zambeze e obtém, nesse mesmo ano, do Governo português, os direitos de prospecção para uma vasta área que abarcava, na época actual, Manica e Sofala, parte do Zimbabué, do Malawi e também da Zâmbia. Tentando seduzir capitais franceses, Paiva de Andrada percorre grande parte desses territórios com técnicos mineiros daquele País (França), mas os relatórios destes são desfavoráveis.

Em Manica associa-se a Manuel António de Sousa, outro predador de almas e terras, verdadeiro senhor da guerra e prazeiro tipicamente feudal. Esta sociedade será frutuosa para os dois e, só no embate que travarão com as pretensões de Cecil Rhodes, é que serão derrotados. Andarilho incansável, percorreu as terras de Manica, Sofala e as do Reino de Gaza, sempre na busca de minas auríferas. Entre finais de 1884 e Fevereiro de 1885 percorre Manica, estabelecendo contactos com régulos e avassalando-os.

No biénio 1886/87, por questões relacionadas com as minas da zona de Manica, desloca-se à corte de Gungunhana pelo que, partindo de Chiloane dirigiu-se à corte deste potentado, atravessando o rio Gorongosa, após o que regressou a Sofala pelo vale do Búzi; de Sofala dirigiu-se ao rio Pungoé, subindo este até Mucaca, segundo depois para Vila Gouveia, donde marchou pelo Barué para o vale do Luenha.
No biénio 1888/89, com o fim de avassalar régulos, parte de Neves Ferreira, segue pelo rio Pungoé até Mucaca e, daqui, segue por Doere, Gomani, Chimoio e Manica; indo depois ao regulado de Mutassa, donde regressou a Vila Gouveia por Chimoio. Depois dum curto repouso segue para o Luenha e interna-se, de seguida, nas terras da Machonalândia (actual Zimbabué).

É um dos pais da feitoria da Beira, estudou a bacia do rio Save bem como a navegabilidade do rio Pungoé, navegabilidade esta que já analisara em 1883, numa expedição que efectuara juntamente com Gorjão de Moura.  Para além de todas esta actividade ainda criou companhias majestáticas, financiadas com capital estrangeiro como, por exemplo, a Companhia de Moçambique, para melhor servir a penetração e consolidação portuguesa nas terras do centro de Moçambique.

Em Outubro de 1890, a disputa de interesses económicos que incidiam sobre a região de Manica fá-lo-ão entrar em rota de colisão com as forças militarizadas de Cecil  Rhodes, a British South Africa Company (BSAC). E é neste contexto que Paiva de Andrada, juntamente com Manuel António de Sousa e João de Resende, sendo este último o representante da Companhia de Moçambique em Manica, acaba preso pelas forças da BSAC, facto este que ocorre a 15 do mês seguinte. Levado para a Cidade do Cabo, acabou por ser libertado, depois dos protestos diplomáticos do Governo português, junto de Londres.

Retirou-se da vida activa em 1907, tendo sido um dos principais percursores da entrada do capitalismo em Moçambique. Durante cerca de duas décadas palmilhou todo o centro e centro sul de Moçambique, um peregrinar pedestre de milhares de quilómetros por entre selvas, pântanos, rios, gentios inimigos, moscas de sono e febres palustres. A sua visão de implementação de companhias majestáticas estava adiantada para a época, ainda muito agarrada, em termos económicos ao sistema feudalizante dos prazos. O surgimento das companhias majestáticas ajudou a partir a resistência armada que muitos senhores de prazos, puros barões feudais, que persistiam na manutenção dum sistema económico feudal, assente na guerra como forma única de satisfazer as suas necessidades básicas. Para todos os efeitos a História veio-lhe dar razão.

Reino/Distrito de Manica - O Reino de Manica remonta ao início do século XVI e ter-se-á criado por fragmentação do Reino do Monomotapa. O seu Rei tinha o título de "Chicanga" e a riqueza mineira do território, aliado à amenidade do clima e abundância de água permitiu a criação de um Estado rico. Por outro lado os manicas dominavam rotas de comércio do ouro entre o interior e os portos marítimos.

Em 1575 Vasco Fernandes Homem atravessou este território, para atingir o Reino do Monomotapa, tendo sido bem acolhido pelos manicas. Foi celebrado um tratado entre os portugueses e o Chicanga, comprometendo-se este a facilitar a actividade mercantil dos portugueses em troca duma pensão anual paga em géneros. Dispondo de um bom dispositivo militar, cerca de 5.000 guerreiros, não é pacífica a teoria se o Reino era ou não avassalado ao Monomotapa.

No decurso do século XVII os chicangas começam a proibir a exploração das minas, devido à ganância dos portugueses e também devido à secagem das ditas minas. Por volta de 1630 recusam pagar qualquer tributo aos monomotapas e apoiam Capararidze, um Monomotapa deposto. O Monomotapa reinante, auxiliado pelos portugueses, derrota e mata o Chicanga, substituindo-o por um irmão, dócil às suas pretensões. O novo Chicanga reabre as minas à exploração e avassala-se ao Monomotapa. Fruto disso surge um incremento de novas feiras, sendo a principal a de Chuambo, perto de Macequece. Em 1673 o Chicanga auxilia o Monomotapa a liquidar alguns portugueses mais gananciosos na sua área.

Apesar disso, em 1719, João de Távora Sampaio reabre a feira de Manica e, ao longo do século XVIII, o relacionamento entre os portugueses e os chicangas foi muito instável. Tinha por base a tentativa dos chicangas controlarem a produção do ouro, no seu Reino, lançando e criando aleatoriamente sucessivos impostos, o que veio a esfriar o relacionamento com os portugueses. Os tributos tinham que ser devidos para pagar travessias, investiduras, recepções, resolução de conflitos e eram direcionados para vários elementos do poder, o que aumentava a carga fiscal. O Reino de Manica avassala-se ao Reino de Changamire e, no final deste século XVIII, entrou em guerra civil, por alteração do ramo dinástico. É nesta fase que se dá a expansão do Reino para o planalto de Inhanga, que se processou até aos princípios do século XIX.

No início deste século continuavam avassalados ao Reino do Changamire. Em 1830 e no seguimento dessa década, a região é assolada por invasões angunes, tendo a própria feira de Manica sido arrasada em 1836. Em 1874 o Reino é de novo invadido por povos do interior pelo que o Rei, que entretanto alterara o título dinástico de Chicanga para Mutassa, pede auxílio a Muzila, do Reino de Gaza. Mas as impis (1) deste acabam derrotadas, pelo que se socorreu a Manuel António de Sousa, tendo os achikundas (2) deste prazeiro debelado o perigo. Devido a isso o Mutassa enviou-lhe uma "ponta da terra", em sinal de submissão. Após a morte deste prazeiro, em 1892, a região sudoeste do território foi anexada pelos reis Lobengula (Rei da Matabelândia e da Machonalândia (3)e Muizilicati (Rei da Matabelândia) e a restante parte do território ficou sob a alçada da Companhia de Moçambique, terminando a existência deste Reino.

O território de Manica está, indelevelmente, ligado àquela companhia majestática mas, ainda mais, ao seu mentor, que foi Paiva de Andrada, que a percorreu em todos os sentidos. Em 1882 Paiva de Andrada elaborou um relatório que entregou na Sociedade de Geografia de Lisboa, onde alertava para que se modificasse o sistema de administração política do território, tendo como princípio basilar a ocupação real e efectiva do mesmo, explicando o quão ténue era a soberania lusitana no centro do território moçambicano. Apoiada nas referências do relatório de Paiva de Andrada, a Sociedade de Geografia de Lisboa propôs ao Governo de Lisboa que fosse criado um comando militar que abrangesse a região de Manica, subordinando-se a mesma a um comando de sessenta soldados e oficialato europeus. Em 14 de Junho de 1884 publicou-se o Decreto que criou o Distrito de Manica, com sede na antiga vila com o mesmo nome. Sobre este território Paiva de Andrada escreveu uma curta memória descritiva, em 1890, e que reza o seguinte:

"Dá-se hoje o nome de Manica tanto ao antigo reino deste nome como ao vasto território que compreende tudo aquilo e que é limitado ao norte pelo rio Zambeze, o qual, por um decreto com força de lei do a no de 1884, constitui desde então um dos actuais dez distritos da província de Moçambique. É só da relativamente pequena terra do reino de Manica, ou de Manica propriamente dita, que me ocupo. O reino de Manica confina ao norte com o antigo reino do Barué e a terra de Unhama, sendo separado do primeiro pelo curso do rio Arângua, que mais próximo da costa toma o nome de Pungoé, ao noroeste e oeste com a grande terra Manhungue, sendo dela em parte separado pelo curso do rio Odzi; a oeste e a sudoeste com a terra Bocha, também separada de Manica pelo rio Odzi; pelo sul e sueste até à margem do rio Revué, com as terras Djingue e Vumba; e finalmente com a terra de Ganda, que compreende todo o território a leste de Manica, situado entre os rios Revué e Pungoé. Direi algumas palavras com respeito aos chefes de todas estas terras do distrito de Manica. O antigo reino do Barué é hoje propriedade particular de dois filhos de Manuel António de Sousa, que há muitos a nos estão a educar em Lisboa por conta do Estado, na Escola Académica, e são netos do velho Mocambo, falecido régulo, que solenemente determinou em vida que o seu reino passasse à propriedade destes seus dois netos. Unhama, que é separado do Barué pelo rio Caurese, afluente do Luenha, tem por chefe o régulo Saunhama, que mais deve ser considerado um Inhacuana ou muanamambo (autoridade) de um prazo da coroa, do que como um régulo. A grande terra de Manhungue, que se estende muito para o norte do território compreendido entre os rios Luenha e seu afluente Mazoé, que limita ao oeste com o rio Mucheque, e que mais para o sul se estende ao longo do Save entre este rio e o rio Odzi até ao limite da terra Bocha, tem como régulo um dos pretos mais inteligentes, mais simpáticos e mais dedicados ao Rei de Portugal que eu conheço; infelizmente é muito velho. É o nosso bem conhecido e sempre leal régulo Macone. Quando pequeno, esteve por bastante tempo na vila de Sena, e tem pelos brancos portugueses como que adoração. Pouco depois de eu e o Manuel António de Sousa termos chegado a Manica, tive notícias de que as manifestações de regozijo na povoação de Macone, quando souberam que estávamos próximos, foram comoventes, e que o régulo declarara que, se o rei de Portugal quisesse entregar a sua terra aos ingleses, ele com toda a sua gente abandonaria esta terra e iria para algum terreno que continuasse a ser verdadeiramente português. Este régulo tem numerosas forças muito aguerridas. As terras Bocha, Djungue e Vumba têm respectivamente como régulos Marangue, Zimunha e Chirara, todos régulos mais pequenos sujeitos a Gungunhana, e que desde a estadia de João de Resende em Manica, mantinham como ele frequentes relações. Ganda é ao mesmo tempo nome da terra e nome da butaca do régulo. É a terra de Quiteve, que já fica mais próxima da costa, fosse um prazo da Coroa. É na terra de Ganda que está a povoação de Chimoio, que tenho citado e é meu particular amigo. Tenho dito em que terras do reino de Manica está encravado. Com relação à sua geografia física e hidrográfica direi que a área deste pequeno território está situada na bacia hidrográfica dos três grandes rios, Pungoé ao norte, Búzi ao centro e leste e Save no sul e sueste. Com relação à bacia dos dois últimos grandes rios, podemos restringir a designação hidrográfica, dizendo, em substituição do que acabo de escrever, que o território de Manica está situado nas bacias dos rios Pungoé, Revué (que é um afluente do Búzi) e Odzi (afluente do Save). O território de Manica é todo muito montanhoso; vindo da costa pelo caminho que indiquei, entra-se nele subindo pelo vale do rio Revué. É na margem esquerda deste rio que estava a antiga vila, feira ou chuambo de Macequece, em ruínas há muitos anos, e que João Resende escolheu em 1888 para sede da Companhia de Moçambique, dando pouco depois à nova povoação ou chuambo o nome de Andrada, continuando a parte da terra de Manica em que a povoação está construída a ter o nome de Macequece. O vale do Revué terá aí dois quilómetros de largura, serpenteando nele o leiro actual do rio; vastas serranias cortadas em parte por importantes afluentes do Revué se elevam dum e doutro lado, separando, as que ficam da margem esquerda, a bacia do Revué da do Pungoé, e as da margem direita, a daquele rio da do rio Odzi. A povoação de Andrada está no vale, mas num pequeno "plateau" suficientemente elevado sobre o leito do rio; de sobre este terraço, a vista do nobre vale comas enormes serras ao norte e sul é realmente encantadora. A montante de Andrada, o vale do rio começa a estreitar-se; as serras de um e outro lado a aproximarem-se, encaixando-se mais o rio, que a uns vinte quilómetros já vai apertado entre elas, correndo em muitas cascatas aí e desde a sua origem, onde as duas linhas de serras já estão unidas; mais para norte e oeste das origens do Revué, tendo desaparecido a bacia central, o grande maciço de serras tem, para um lado, vertentes para o Odzi. Tendo na minha primeira viagem a Manica feito caminho pelo Barué e atravessado o Pungoé muito em cima e em altura onde a divisória das águas deste rio e do Revué tem mais de quatro mil pés, supus durante muito tempo que a bacia do Revué era um verdadeiro "cul de sac" e que não poderia ser aproveitada como via de grande penetração para o interior. Há três anos tive razões para supor o contrário e desde então repetidas vezes tenho minuciosamnte informado a Direcção Geral do Ultramar sobre o assunto, tratando da enorme importância económica que deve vir a ter o caminho de ferro, a que desde o princípio dei nas minhas comunicações o nome de caminho de ferro de Sanhate. Num dos ofícios que estão em viagem para Lisboa, dou detidas informações acerca de Andrada, descrevendo edifícios, citando dimensões, para demonstrar como é bem manifesta na localidade a efectividade de uma sólida ocupação. Por curiosidade histórica, João de Resende levantou, no ano de 1888, as muralhas do nosso antigo forte, e dentro dele fez muitas construções, incluindo a grande casa de alvenaria em que ele mora e estão os escritórios da companhia; fora do forte, há também casas de alvenaria e muitas construções de madeira onde moram empregados europeus, outras para hospedar mineiros e mais pessoal que por ali passa constantemente, e alijamentos para numerosos pretos de serviço. Entre as ruínas das casas do antigo chuambo há muitas que mostram ainda claramente todas as repartições interiores. Na maior parte, estas ruínas são de casas de que se sabe quem eram os antigos donos. Uma delas era de um tio e sogro de Manuel António de Sousa; e ainda vive em Macequece um preto, bem velho, falando correntemente português, que foi criado do falecido parente de Manuel António de Sousa e que habitou na casa a que me refiro. Também por curiosidade histórica, Manuel António de Sousa resolveu mandar levantar uma nova casa, exactamente no lugar e com as repartições que a antiga tinha, e para este fim já se tinha começado a limpar do mato e ervas o local das ruínas. A uns cinco quilómetros a montante de Andrada e do lado da mesma margem, tem o Revué um importante afluente chamado Chua, que se despenha de um "plateau" elevado e cujo curso depois se desenvolve  num largo vale que parece todo rodeado de enormes montanhas. Aí trabalham mais de vinte mineiros e operários portugueses, espanhóis e franceses, empregados todos da Companhia de Moçambique. As barracas, algumas em forma de bonitos "chalets", em que estes empregados da Companhia vivem, espalhadas pelas encostas dos montes, tinham uma aparência muito pitoresca, e a todos revelavam um centro de actividade de gente branca. Em todos os países, o tipo geral das construções dependo do material que para elas mais facilmente pode ser empregado. Os ingleses do Cabo e do Natal, que não têm o flagelo da mosca tsé-tsé, e podem fazer os seus transportes em carros, e que além disso, como no horroroso país em roda de Kimberley e em torno de grandes centros de actividade do Transval, não têm arvoredo, utilizam, como material mais económico e de mais fácil emprego, a folha de ferro ondulada para fazerem as suas habitações. À cabeça de carregadores e por entre o mato não é possível transportar grandes folhas de ferro, pesadas e flexíveis; por outro lado temos abundância de madeira; portanto, as nossas primeiras habitações, correspondentes às abafadoras barracas de folha inglesa, são de madeira e palha, aliás muito melhor abrigo contra o calor; mas esta diferença justificada do sistema de construção é frequente objecto de crítica e de censuras contra nós. Direi, como curiosidade, que o Dr. Jameson (4), portador das minhas recomendações, hospedado pela Companhia de Moçambique, o melhor que foi possível na estação Sarmento, numa barraca rectangular com duas repartições, asseada, e de confortável abrigo, quando deitado e lendo os jornais, teve a contrariedade de deitar fogo a esta barraca, comunicando-se o incêndio a todas as construções da Companhia de Moçambique que ali havia, do lado para onde soprava o vento. Quando soube da notícia, compreendi o aborrecimento que o doutro deveria de ter tido; mas não me deixei de ressentir um pouco, quando mais tarde, por acaso, encontrei publicada num jornal da África do Sul uma crítica desfavorável acerca da aparência caquética do chefe da secção de Sarmento, e da natureza inflamável das casas desta estação. Continuando nas informações acerca do Revué direi ainda que mais acima, quando o rio já está encaixado entre montanhas próximas, há a povoação de Mogudo, parente do Mutaça, chefe desta região, e o antigo e constante emissário do régulo nas suas relações com o comandante militar de Sena e capitão-mor de Manica. Nesta bacia do Revué há poucas povoações indígenas. Nas vertentes do Pungoé ou na região norte de Manica, o país ainda é mais deserto. Nos rios desta vertente, designados nos documentos antigos como sendo muito auríferos, tinha agora a Companhia de Moçambique alguns pesquisadores. Toda a linha divisória de águas entre as vertentes do Pungoé e as do Revué, dentro de Manica, tem uma grande cota, formando as serras entre os dois rios por toda a parte uma barraca que é muito difícil de transpor. Assim é claro que, salvo despesas excessivas com aberturas de túneis, ou construção de linhas funiculares, seria impossível fazer seguir um caminho de ferro como está marcado em projecto no mapa da província de Moçambique, vindo da costa pelo vale do Pungoé para, depois de já ter entrado em Manica, passar para o Revué; e o mesmo se daria se pretendêssemos que o caminho que efectivamente se há-de construir, da margem do Pungoé, atravessando no Quiteve, mais próximo da costa, e enquanto a divisória tem pequena cota, para a bacia do Revué, de entrando em Manica pelo vale deste rio, continuasse para o interior, passando nessa altura para o vale do Pungoé. Por este lado, pois, a penetração é quase impossível. A terceira grande bacia hidrográfica em que está situado o território de Manica é, como disse, a de Saveo, ou mais restritamente a do Odzi; este rio serve, do lado poente, de limite ao reino de Manica, e portanto todo o terreno a que me refiro está nas vertentes, ou directamente do rio principal, ou dos numerosos afluentes da sua margem esquerda. Para simplificar, citarei, a partir de jusante para montante, apenas, e por motivos especiais, três desses afluentes que não são geograficamente os mais importantes: o Sucura, o Mutare, que alguns ingleses nas suas correspondências designam pelo nome de Untáli, e o Zonzoro. Podemos teoricamente considerar estes três rios paralelos, indo sucessivamente confluir em três pontos da margem esquerda do Odzi, sendo os restantes vales, bem como os dos outros afluentes intermédios não mencionados, separados uns dos outros por grandes esporões muito elevados, junto das terras divisórias do Revué e do Odzi, das quais destacam, e que vão diminuindo de cota e desaparecendo à proporção que se aproximam do vale do último destes rios. Os dois primeiros citados afluentes nascem nas serras que separam a bacia do Revué do Odzi, o terceiro nasce mais a oeste, e quando o Revué já tem acabado, no grande maciço que separa o Odzi do Pungoé. As enormes serras que separam o Revué do Odzi são, tanto numa como noutra vertente, profundamente entalhadas por numerosos rios, entre os quais estão os três citados, por cujos vales se pode subir até atingir diversos colos ou gargantas onde, com mais ou menos facilidade, se passa duma para outra bacia hidrográfica. É nas vertentes do Odzi e seus afluentes que está a maior parte da população indígena de Manica; no Mutare e numa relativamente pequena área, que todos os pesquisadores declaram não ter na Califórnia, na Austrália ou em qualquer parte do mundo, rival em abundância e riqueza de filões auríferos, é que desde 1888 têm sido feitas as principais descobertas de filões, e é ali que estão, ou pelo menos estavam, muitos empregados da Companhia de Moçambique e a maior parte dos representantes e pesquisadores das empresas arrendatárias que têm pessoal em Manica. A aringa (5) do régulo Mutassa está situada na bacia hidrográfica de Odzi junto à margem do rio Zonzoro e portanto mais a oeste do que todos os outros lugares de que tenjho falado, o que explica como agentes da "British South Africa Company", vindo do interior e tendo atravessado o Odzi, chegaram à aringa do régulo sem que, nem no Mutare, nem no Chua, nem em Macequece ou em Andrada, o ponto que fica mais a leste, por alguns dias houvesse conhecimento da sua chegada. Parece-me que quem ler esta breve descrição que tenho feito poderá facilmente traçar um esboço, mostrando a posição relativa das diferentes localidades cujos nomes são frequentemente citados."

Após a independência de Moçambique os limites geográficos de Manica mantiveram-se inalterados mas, de Distrito, passou a Província.
(1) - Regimento, coluna militar; o mesmo que "manga".
(2) - Termo que definia o escravo guerreiro que, na Zambézia, servia militarmente o seu amo, o prazeiro (senhor dos prazos). O termo achikunda é uma forma aportuguesada do verbo chona-caranga "kukunda", que significa "vencer". Os achikundas teriam tido a sua génese por volta de meados do século XVII, sendo recrutados de diversos povos. O conjunto destes escravos armados, com funções militares, policiais, guarda-costas e também de caçadores, formavam os exércitos privados dos senhores dos prazos, chegando a atingir a casa dos milhares, nalguns casos. Pertenciam à elite dos escravos e não podiam ser vendidos. Era-lhes permitido escravizar elementos das populações vencidas nas suas incursões e mantê-los como sua propriedade. Só tinham funções de guerra mas, no correr dos tempos, com o decréscimo populacional devido a guerras, doenças, fome e o crescimento desmesurado do tráfico de escravos, levou muitos prazeiros a vendê-los pondo fim, deste modo, a uma tradição secular o que provocou, no decorrer do século XIX, diversas revoltas destes achikundas contra os seus donos. Com o advento do capitalismo e a lenta abolição do comércio esclavagista e um melhor domínio administrativo do poder colonial, os achikundas evoluíram para os sipaios.
(3) - Territórios integrados na actual República do Zimbabué.
(4) - Refere-se a Leandar Jameson, braço direito de Cecil John Rhodes (este já biografado em 31/12/2011), sendo ambos inimigos acérrimos dos portugueses.
(5) - Aldeia fortificada, de raiz zambeziana, cuja concepção poderá ter sido desenvolvida a partir da ideia dos musitus, mas em escala maior e com outros tipos de materiais, situadas juntos de cursos de águas ou estradas importantes, tendo funções quer defensivas quer ofensivas. Muralhadas a troncos de árvores entrelaçadas, ou pedras, com seteiras, podendo-se ainda levantar paliçadas e, por vezes, separadas por valas, estes recintos bem fortificados tinham, no seu interior, para além da casa do prazeiro e do seu pessoal, bem como do gado, todo o tipo de casas oficinais necessárias à manutenção da cidadela. Correspondia, no Sul, ao kraal ou aos cocolenes.


Leituras



Sobre Bartolomeu Dias e a sua época aponto dois bons romances históricos, cuja aquisição e leitura recomendo, a saber:

Registo o agrado que me proporcionou a leitura do romance histórico "Levante, 1487 - a vã glória de João Álvares", de José Maria Pimentel (Edição do Autor, 2010, 444 págs.) que se reporta à viagem em que, pela primeira vez, navios lusos liderados por Bartolomeu Dias, mergulharam as quilhas dos seus navios em dois oceanos: o Atlântico e o Índico.

Transcrevo aqui o esclarecedor conteúdo da contra-capa do livro: "Acontece na costa desértica do Namib. Três naus do Rei João de Portugal (duas caravelas e uma urca) lançam ferro num lugar já conhecido de antes como Angra do Salto. A escala leva apenas o tempo necessário para o transbordo de todos os mantimentos para as caravelas, que abalam logo depois para a descoberta mais ansiada do Rei - a passagem para o mar das Índias, pelo sul do grande continente africano.
Na Angra do Salto fica a esvaziada urca dos mantimentos. Fica também o capitão Diogo Dias, com o encargo de a aprovisionar com água e mantimentos até ao glorioso regresso das caravelas do seu irmão - o capitão-mor Bartolomeu Dias.
João Álvares é o mestre da urca, competente, com origem nobre, dotes de bravura e um mesquinho azedume contra os caminhos da política no Reino. Com ele, são nove os marinheiros que, durante nove longos meses, comungam na inóspita angra com os Kwepes locais desígnios inimagináveis. Chegam as caravelas do cabo e recolhem os sobreviventes e os sinais do drama, e transportam-nos até ao poderoso rio do grande Reino do Kongo, onde se consuma a missão do Rei João e se sepultam segredos."

Baseado em factos históricos que aconteceram, suportado por uma boa bibliografia, dotado dum interessante glossário alfabético para os leitores menos avindos a termos de antanho e narrado na primeira pessoa de seis dos participantes desta viagem que partilham, no meio de muitos outros camaradas da aventura, o exíguo espaço das embarcações, a escrita torna-se de tal modo cativante e galopante, que o livro se transforma numa máquina do tempo e nos leva aos idos de 1487 e, de leitor, nos tansforma num qualquer anónimo marujo ali presente.

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O outro romance histórico sobre Bartolomeu Dias que, há muito, me prendeu trata-se de "O navegador da passagem - a história de um descobridor de mundos que o Mundo ignorou" , da autoria de Deana Barroqueiro (Porto Editora, 2008, 437 págs.). A minha paixão pela escrita de Deana Barroqueiro não me tolda a mente nem me desfoca o sentir lúdico que tenho pelos pontilhados da ponta da sua pena. 

"O navegador da passagem" é o romance de um homem amargurado, que se sente injustiçado por, ao ter aberto as portas da estrada aquática da canela, do cravinho e do colorau (mas não tendo franqueado as mesmas) foi forçado a deixar que outros depois de si as passassem e, à premonição da chegada do seu fim, anunciado num cometa quando ia de navegação no Atlântico Sul, revê a sua vida, no muito que deu e no pouco que recebeu.

Deana Barroqueiro, consagrada capitã-mor desta imaginária jornada quinhentista, leva-nos a viajar  pelas cortes joanina e manuelina, puros viveiros de intrigas, maledicências e traições, onde tudo era válido pela benesse da proximidade do poder, traçando-nos os perfis de Dom João II e de Dom Manuel I , férreo o primeiro e sortudo o segundo, para além de nos fazer embarcar em naus claustrofóbicas, pútridas e sobrelotadas de anónimos miseráveis que pouco se apercebiam do gigantismo que estavam a construir, naus carregadas de febres, viscosidades e doenças mas, onde no meio deste pantanal de madeirame, era capaz de florir o amor ficcionado da escrava Leonor pelo seu amo.

Bem documentado, pelo que se pode observar pela bibliografia consultada, bem estruturado na sequência narrativa dos factos, e bem encorpado numa linguagem escrita que, atirando-nos por vezes para as expressões da época, torna-se clara quando enquadrada no todo do texto, é mais um livro que lustra as letras portuguesas. Aqui e em qualquer parte do mundo. Por isso, sem complexos e com o à vontade de quem nunca se cruzou com a Autora posso, camonianamente, dizer: "Ditosa Cultura que tal escritora tem". 

Poesia


Ao ler a paixão romanceada da escrava Leonor por Bartolomeu Dias, veio-me à memória uma personalidade que tive a felicidade de conhecer e que que me honrou fazendo o favor de ter sido meu amigo, conselheiro e, acima de tudo, meu Mestre.

Refiro-me ao Professor Fernando de Macedo, poeta e dramaturgo que, infelizmente para mim e para muitos, já partiu para a Grande Grande Viagem. Conheci-o num jantar de aniversário de Umbelina Gil,  cantor da ilha do Príncipe.
Oriundo de São Tomé, neto do último Rei angolar daquela ilha, intelectual de craveira, Professor Universitário (jubilado quando o conheci), resistente à Ditadura e "compagnon de route" de muitos que ousaram dizer "não" a quem não nos queria deixar dizer "não" e que, depois, inicia um longo e lento caminho para o conservadorismo e a redescoberta do cristianismo, deixou em mim, apesar de muitas saudáveis divergências, uma saudade imensa. 

Mas deixou-nos os seus escritos, parte dos quais eu tive o sublime prazer de os dactilografar em primeira mão.  Dum conjunto de poemas inspirados na leitura do livro "História Trágico-Marítima" (anotada por António Sérgio, Editorial Sul, Lda.) a que ele titulou de "Mar e Mágoa" (Edição do Autor, São Tomé, 1994, 99 págs.) retiro e transcrevo dois poemas, titulados de "Leonor, Leonor" e "O lamento da escrava", poemas estes que me foram trazidos à memória pelo leitura dos amores da escrava Leonor no livro de Deana Barroqueiro, acima referido.


Leonor, Leonor
Descalça ondulante
alva e nua
ancas d´arremesso d´ondas
areias pisando ardente.
Ah! Leonor
Olhos d´Eden perdido
seios renegando angústia
passo lento
sem destino apetecido.
Oh! Leonor
Em sensual tristeza
d´abandonado desejo
chão abraça em desespero
como se ela a natureza.
Leonor, Leonor!
Poema baseado no seguinte texto: "E vendo-se D. Leonor despida, lançou-se logo ao chão e cobriu-se toda com seus cabelos que eram muito compridos, fazendo uma cova na areia, onde se meteu até à cintura sem mais se erguer dali. Manuel de Sousa foi então a uma velha sua aia, que lhe ficara ainda uma mantilha rota, lha pediu para cobrir D. Leonor, e lha deu; mas contudo nunca mais se quiz erguer daquele lugar onde se deixou cair quando se viu nua." - História Trágico-Marítima; Perda do Galeão Grande São João; Pág. 35, Volume 1. 
O lamento da escrava
De mim, tens memória, senhor?
Sou quem ao fogo
te refugou peixe seco
e à noite te dava amor.
Sou aquela que escolheste
percorrendo a sanzala
(esta não, aquela sim)
fui eu a que recebeste.
Eu sei que outros levaram
o suor dos nossos corpos
e a muitos maltrataram.
Tu não foste assim.
Porque morreste, deixando
teu calor dentro de mim?

Poema baseado no seguinte texto: "Depois que André Vaz se apartou de Manuel de Sousa e sua mulher, ficou com ele Duarte Fernandes, contra-mestre do galeão, e algumas escravas das quais se salvaram três." - História trágico-marítima, Perda do Galeão Grande S. João, pág. 36, Volume 1.

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Esta noite, quando fechar o computador, vou reler "Mar e Mágoa", beber um tinto amornado e saborear um cigarro forte (como ele o faria). E sei que terei por companhia Fernando Macedo, com a sua longa cabeleira branca afunilada em rabo de cavalo, o seu sorriso sarcástico e o seu humor bonacheirão. Mesmo em holograma a sua companhia é-me mais querida que muitos de carne e osso. 
Culinária
Leitor que sou de tudo o que a escritora Deana Barroqueiro escreve, tive oportunidade de, tempos atrás, ter lido uma receita de culinária que a mesma publicou no seu blogue, no pretérito 17 de Fevereiro, receita essa que se reportava a "Lulas à Coge Çofar".
Amante que sou de adquirir, entre diversas coisas, de revistas antigas de culinária tenho uma "Crónica Feminina Culinária" nº 11 (sem data de lançamento mas reportando-se à década de 60/70 do século passado) a qual contou com a participação "dos mestres de cozinha, doçaria e serviço de mesa do Hotel Ritz de Lisboa." (sic)
Ora bem descobri aí, na página 31, a receita do "Bolo da Rainha do Sabá", receita essa que, cá em casa, já produzimos (1). Não achei nada de especial no bolo e, ainda hoje, estou para saber o que teria a ver a mítica Balkis, Rainha do Sabá, com este bolo. 



Mas podemos fantasiar que foi o doce que ela, juntamente com  o Rei Salomão, manjou na única noite em que se amaram e cujo fruto se viria a chamar Menelik, génese de uma lendária linhagem dinástica etíope que viria a fenecer nos revolucionários idos de 1975, com a morte do Negus Hailé Selassié que, para muitos crentes do Kebra Nagast, foi o último descendente directo da Casa Real judaica.

Caramba, o que um bolo nos põe a fantasiar. Mas, de qualquer modo, aqui vai a receita que transcrevo sem qualquer alteração:

"Desfazem-se no almofariz 60 gr. de amêndoas. Derretem-se 125 gr. de chocolate, partido em bocadinhos, em duas colheres-de-sopa de água a ferver, deixando-se cozer durante 10 minutos. Há quem deite 2 colheres-de-café deste produto solúvel na água a ferver que se destina a derreter o chocolate.
Acrescentam-se 125 gr. de manteiga ao chocolate, trabalha-se de forma a obter-se uma massa, incorporando-se depois as amêndoas, o açúcar (125 gr.), a farinha (50 gr.) e 3 ovos. Mexe-se muito bem sempre que se acrescenta um novo elemento.
Unta-se uma forma de "charlotte" e deita-se-lhe dentro a preparação, que cozerá no forno, em banho-maria, durante 35 ou 40 minutos. Deixa-se arrefecer, desenforma-se e serve-se coberto com natas batidas adicionadas de açúcar baunilhado."
(1) Digo "produzimos" pois tenho uma parceria com a minha mulher: ela faz os bolos e eu como-os.


Vai acontecer

Durante o corrente mês de Março uma exposição comemorativa do centenário do nascimento de Manuel da Fonseca, figura grada das letras portuguesas do século XX, nas áreas do conto, crónica e romance. Na Biblioteca Museu da República e da Resistência (Rua Alberto Sousa - 10 A - Zona B do Rêgo - Lisboa) durante as horas normais de expediente. Entrada livre.

Encontro de escritores lusófonos onde tecerão comentários sobre o estado da literatura e poesia nos seus diversos países. No próximo dia 17 de Março, pelas 15H00, na Biblioteca Municipal Por Timor (Rua S.Bento - 182/184 - Lisboa). Entrada livre.

Exposição colectiva de artes plásticas, subordinada ao tema "Os Cavaleiros Templários". Entre os dias 18 e 30 de Março corrente, na Casa da Cultura dos Olivais (R. Conselheiro Mariano de Carvalho - 67/68 - Olivais - Lisboa).


Aconteceu

Mais uma vez o nosso mui amado Venerando Chefe de Estado voltou a borrar a pintura, agora a acertar contas atrasadas com José Sócrates, no seu prefácio do livro "Roteiros VI". O homem não acerta mesmo, coitado. Eu ando para aqui a cogitar que ele vai ter que nascer duas vezes para aprender a ser um político a sério. Sobre este seu comportamento muito se tem escrito e eu nada de novo viria para aqui  debitar. Até porque quase ninguém me lê e ninguém me liga nenhuma, que é o mais certo. Mas, de qualquer modo, de tudo o que se escreveu recomendo a leitura do artigo de opinião de Gonçalo Bordalo Pinheiro que, sobre este tema, publicou na Visão nº 411, subordinada ao título "As perguntas da semana". Lapidar.

Leio no Público que os golfinhos voltaram ao Tejo. Mas apenas pintados nas sapatas da Ponte 25 de Abril. É pena, mas é o mundo em que vivemos. É tudo ou quase tudo fictício, virtual, a fingir.

A Procuradora Cândida de Almeida, Directora da Direcção Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), estranhou que se tivesse feito burburinho por a Caixa Geral de Depósitos (CGD) ter patrocinado um Congresso do Sindicato que os representa. Disse a senhora que a escolha do banco se devera a ser do Estado, com dinheiros 100% públicos e não correr nenhum processo crime daquela instituição bancária. Azar. Quatro dias depois (13/03) destas afirmações o Diário de Notícias parangonava uma notícia onde quatro gestores da CGD tinham sido acusados pelo DIAP de Évora por burla tributária. Anda a dormir esta senhora?

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