"O Mundo não é uma herança dos nossos pais, mas um empréstimo que pedimos aos nossos filhos" (Autor desconhecido)

terça-feira, 13 de março de 2012

Bartolomeu Dias

Viajantes, aventureiros e exploradores


Bartolomeu Dias - (?/Atlântico Sul, 1500) - Navegador. Sendo desconhecida a sua data e local de nascimento, sabe-se que o mesmo era escudeiro real. A existência de vários homónimos seus contemporâneos obrigou eméritos historiadores a destrinçarem os factos que, historicamente, se podem atribuir sem dúvidas a este navegador.

A real política joanina da época centrava-se num objectivo: o atingimento da Índia contornando a costa do continente africano, pelos mares do Sul e, em simultâneo, a recolha de informes sobre a terra das especiarias, pelos caminhos do Oriente.

Se para Oriente foram enviados uns quantos espiões, nos quais se elevou o grande Pêro da Covilhã, "primus inter pares"; já para os mares meridionais, depois de sistematizadas as navegações, avultou a figura de Bartolomeu Dias que viria da dobrar o baptizado Cabo das Tormentas e rebaptizado Cabo da Boa Esperança.

Feito Capitão-Mor, por nomeação real, Bartolomeu Dias lidera uma expedição marítima de três navios que, em Agosto de 1487 sai de Lisboa rumando para o Sul da costa africana. Das três caravelas, comanda directamente uma, sendo as outras entregues ao seu irmão Diogo Dias e a João Infante. Tendo atingido a Serra Parda, onde findara o descobrimento anterior de Diogo Cão, navega à vista da linha da costa,  até atingir o Cabo das Voltas, em data incerta e, logo de seguida, a Angra das Voltas, assim apelidada pelo constante bolinar das naus, ou seja "pelas muitas voltas em que então ali andaram" (João de Barros, Ásia"); 

Deixando um dos três navios com alguns tripulantes, liderados pelo seu irmão Diogo Dias, na costa namibiana a fim destes tratarem de se reabastecerem de provisões que melhor aconchegassem os restantes aquando do seu regresso segue sempre na derrota para Sul acompanhado pelo navio capitaneado por João Infante.

A 26 de Dezembro atinge o Golfo de Santo Estevão; na dobragem do novo ano avista a Terra de São Silvestre e seis dias após o nascimento do novo ano atinge a serra dos Reis; após o que apanha ventos suestes que obrigam ao abandono da navegação à vista da costa durante dias, sempre para sul. Quando atinge a latitude dos ventos Oeste (35º a 40º Sul) e apanhando mares "já muito frios" (João de Barros, "Ásia") os navegantes flectem para Leste e, perante a ausência de terra que não logravam ver, Bartolomeu Dias ruma para Norte. Tinha ultrapassado o extremo meridional africano e rumavam agora no Oceano Índico, até que lograram avistar costa, a Angra de São Braz, a 03 de Fevereiro de 1488 e aguam na angra dos Vaqueiros. Prosseguindo a viagem na rota índica aporta na zona do rio Infante (Great Fish River), assim apelidado por ter sido o navio capitaneado por João Infante o primeiro a tê-lo atingido.

Acabando por ceder às pretensões de grande parte da sua tripulação que, cansada da viagem e com parcos meios para navegarem em mares desconhecidos, requer o regresso ao Reino. Efectua a torna-viagem, explorando agora os cabos das Agulhas e das Tormentas, acabando por chegar à barra de Lisboa num incerto dia de Dezembro de 1488.

Esta decisão de regressar ao Reino acabará por lhe cercear, no futuro, a nomeação para liderar outras viagens exploratórias, pois Dom João II não lhe perdoará a tibieza com que defrontou o motim da tripulação. O monarca tivera a percepção que se perdera ali, nas costa meridionais índicas, a rara ocasião de se ter antecipado o relógio da História. Um dos factos desta amargura real prende-se com o facto de, por exemplo, Bartolomeu Dias não ter sido feito nobre, contrariamente a que sucedera com Diogo Cão.

Na sucessão real, o novo Rei (D.Manuel I) acompanhará o pensar do seu antecessor e Bartolomeu Dias não é escolhido para liderar ou mesmo participar na armada que rasgará o véu do desconhecimento dos mares índicos; sendo o comando da mesma entregue a Vasco da Gama.

Após ter cumprido a viagem da sua vida, continua ligado à marinha sem grandes aparatos, para além de ter exercido o cargo de recebedor do Armazém da Guiné, entre 1494 e 1497 até que, em 1500, capitaneando uma nau integrada na Armada de Pedro Álvares Cabral, após o achamento do Brasil, Bartolomeu Dias cumpre a viagem da sua morte ao acompanhar o destino do seu navio num naufrágio que os apanha no Atlântico Sul.  

Postumamente o Rei D. Manuel I, a 02 de Julho de 1501, publica um alvará no qual, atendendo ao facto de ter morrido ao serviço da Coroa e, sem sequer aludir à sua descoberta da dobragem do Cabo da Boa Esperança, perdoa-lhe algumas verbas que estaria em dívida quando exercera o cargo de recebedor do Armazém da Guiné (que exerceu entre 1494 e 1497), dizendo: "... a quantos esta nossa carta de quitação virem, fazemos saber que pela arrecadação da conta que foi tomada a Bartolomeu Dias, escudeiro da nossa Casa e recebedor que foi do Armazém da Guiné nos anos de 1494, 1495, 1496 e parte do ano de 1497 se mostra receber de dinheiro doze contos novecentos e noventa e dois mil e dois reais, e muitas artilharias, pólvora, navios, cordoalha, enxárcia, velas, mastros, vergas e outras muitas coisas necessárias para despesas e maneio da dita casa, as quais aqui se não declaram para escusar larga leitura; do qual dinheiro e coisas, posto que pelo encerramento da dita arrecadação se mostre algumas delas ficar devendo a nós, por o dito Bartolomeu Dias falecer em nosso serviço na viagem da Índia, onde o enviámos

Na magnanimidade real prevalecera a sua morte em serviço, em detrimento do feito maior que fora a dobragem do Cabo Tormentoso.

Historiando Moçambique Colonial

Paiva de Andrada - (Lisboa, 1846 - Paris, 1928 - Joaquim Carlos Paiva de Andrada) - Explorador e Oficial do Exército Português (Coronel). Explorador de grande mérito é considerado, à escala lusitana, o "Cecil Rhodes português". Tendo concluído o curso de Oficial de Artilharia em 1867 é nomeado, dez anos mais tarde, adido militar em Paris, tendo assistido à guerra franco-prussiana. No ano seguinte (1878) cria a Sociedade dos Fundadores da Companhia Geral do Zambeze e obtém, nesse mesmo ano, do Governo português, os direitos de prospecção para uma vasta área que abarcava, na época actual, Manica e Sofala, parte do Zimbabué, do Malawi e também da Zâmbia. Tentando seduzir capitais franceses, Paiva de Andrada percorre grande parte desses territórios com técnicos mineiros daquele País (França), mas os relatórios destes são desfavoráveis.

Em Manica associa-se a Manuel António de Sousa, outro predador de almas e terras, verdadeiro senhor da guerra e prazeiro tipicamente feudal. Esta sociedade será frutuosa para os dois e, só no embate que travarão com as pretensões de Cecil Rhodes, é que serão derrotados. Andarilho incansável, percorreu as terras de Manica, Sofala e as do Reino de Gaza, sempre na busca de minas auríferas. Entre finais de 1884 e Fevereiro de 1885 percorre Manica, estabelecendo contactos com régulos e avassalando-os.

No biénio 1886/87, por questões relacionadas com as minas da zona de Manica, desloca-se à corte de Gungunhana pelo que, partindo de Chiloane dirigiu-se à corte deste potentado, atravessando o rio Gorongosa, após o que regressou a Sofala pelo vale do Búzi; de Sofala dirigiu-se ao rio Pungoé, subindo este até Mucaca, segundo depois para Vila Gouveia, donde marchou pelo Barué para o vale do Luenha.
No biénio 1888/89, com o fim de avassalar régulos, parte de Neves Ferreira, segue pelo rio Pungoé até Mucaca e, daqui, segue por Doere, Gomani, Chimoio e Manica; indo depois ao regulado de Mutassa, donde regressou a Vila Gouveia por Chimoio. Depois dum curto repouso segue para o Luenha e interna-se, de seguida, nas terras da Machonalândia (actual Zimbabué).

É um dos pais da feitoria da Beira, estudou a bacia do rio Save bem como a navegabilidade do rio Pungoé, navegabilidade esta que já analisara em 1883, numa expedição que efectuara juntamente com Gorjão de Moura.  Para além de todas esta actividade ainda criou companhias majestáticas, financiadas com capital estrangeiro como, por exemplo, a Companhia de Moçambique, para melhor servir a penetração e consolidação portuguesa nas terras do centro de Moçambique.

Em Outubro de 1890, a disputa de interesses económicos que incidiam sobre a região de Manica fá-lo-ão entrar em rota de colisão com as forças militarizadas de Cecil  Rhodes, a British South Africa Company (BSAC). E é neste contexto que Paiva de Andrada, juntamente com Manuel António de Sousa e João de Resende, sendo este último o representante da Companhia de Moçambique em Manica, acaba preso pelas forças da BSAC, facto este que ocorre a 15 do mês seguinte. Levado para a Cidade do Cabo, acabou por ser libertado, depois dos protestos diplomáticos do Governo português, junto de Londres.

Retirou-se da vida activa em 1907, tendo sido um dos principais percursores da entrada do capitalismo em Moçambique. Durante cerca de duas décadas palmilhou todo o centro e centro sul de Moçambique, um peregrinar pedestre de milhares de quilómetros por entre selvas, pântanos, rios, gentios inimigos, moscas de sono e febres palustres. A sua visão de implementação de companhias majestáticas estava adiantada para a época, ainda muito agarrada, em termos económicos ao sistema feudalizante dos prazos. O surgimento das companhias majestáticas ajudou a partir a resistência armada que muitos senhores de prazos, puros barões feudais, que persistiam na manutenção dum sistema económico feudal, assente na guerra como forma única de satisfazer as suas necessidades básicas. Para todos os efeitos a História veio-lhe dar razão.

Reino/Distrito de Manica - O Reino de Manica remonta ao início do século XVI e ter-se-á criado por fragmentação do Reino do Monomotapa. O seu Rei tinha o título de "Chicanga" e a riqueza mineira do território, aliado à amenidade do clima e abundância de água permitiu a criação de um Estado rico. Por outro lado os manicas dominavam rotas de comércio do ouro entre o interior e os portos marítimos.

Em 1575 Vasco Fernandes Homem atravessou este território, para atingir o Reino do Monomotapa, tendo sido bem acolhido pelos manicas. Foi celebrado um tratado entre os portugueses e o Chicanga, comprometendo-se este a facilitar a actividade mercantil dos portugueses em troca duma pensão anual paga em géneros. Dispondo de um bom dispositivo militar, cerca de 5.000 guerreiros, não é pacífica a teoria se o Reino era ou não avassalado ao Monomotapa.

No decurso do século XVII os chicangas começam a proibir a exploração das minas, devido à ganância dos portugueses e também devido à secagem das ditas minas. Por volta de 1630 recusam pagar qualquer tributo aos monomotapas e apoiam Capararidze, um Monomotapa deposto. O Monomotapa reinante, auxiliado pelos portugueses, derrota e mata o Chicanga, substituindo-o por um irmão, dócil às suas pretensões. O novo Chicanga reabre as minas à exploração e avassala-se ao Monomotapa. Fruto disso surge um incremento de novas feiras, sendo a principal a de Chuambo, perto de Macequece. Em 1673 o Chicanga auxilia o Monomotapa a liquidar alguns portugueses mais gananciosos na sua área.

Apesar disso, em 1719, João de Távora Sampaio reabre a feira de Manica e, ao longo do século XVIII, o relacionamento entre os portugueses e os chicangas foi muito instável. Tinha por base a tentativa dos chicangas controlarem a produção do ouro, no seu Reino, lançando e criando aleatoriamente sucessivos impostos, o que veio a esfriar o relacionamento com os portugueses. Os tributos tinham que ser devidos para pagar travessias, investiduras, recepções, resolução de conflitos e eram direcionados para vários elementos do poder, o que aumentava a carga fiscal. O Reino de Manica avassala-se ao Reino de Changamire e, no final deste século XVIII, entrou em guerra civil, por alteração do ramo dinástico. É nesta fase que se dá a expansão do Reino para o planalto de Inhanga, que se processou até aos princípios do século XIX.

No início deste século continuavam avassalados ao Reino do Changamire. Em 1830 e no seguimento dessa década, a região é assolada por invasões angunes, tendo a própria feira de Manica sido arrasada em 1836. Em 1874 o Reino é de novo invadido por povos do interior pelo que o Rei, que entretanto alterara o título dinástico de Chicanga para Mutassa, pede auxílio a Muzila, do Reino de Gaza. Mas as impis (1) deste acabam derrotadas, pelo que se socorreu a Manuel António de Sousa, tendo os achikundas (2) deste prazeiro debelado o perigo. Devido a isso o Mutassa enviou-lhe uma "ponta da terra", em sinal de submissão. Após a morte deste prazeiro, em 1892, a região sudoeste do território foi anexada pelos reis Lobengula (Rei da Matabelândia e da Machonalândia (3)e Muizilicati (Rei da Matabelândia) e a restante parte do território ficou sob a alçada da Companhia de Moçambique, terminando a existência deste Reino.

O território de Manica está, indelevelmente, ligado àquela companhia majestática mas, ainda mais, ao seu mentor, que foi Paiva de Andrada, que a percorreu em todos os sentidos. Em 1882 Paiva de Andrada elaborou um relatório que entregou na Sociedade de Geografia de Lisboa, onde alertava para que se modificasse o sistema de administração política do território, tendo como princípio basilar a ocupação real e efectiva do mesmo, explicando o quão ténue era a soberania lusitana no centro do território moçambicano. Apoiada nas referências do relatório de Paiva de Andrada, a Sociedade de Geografia de Lisboa propôs ao Governo de Lisboa que fosse criado um comando militar que abrangesse a região de Manica, subordinando-se a mesma a um comando de sessenta soldados e oficialato europeus. Em 14 de Junho de 1884 publicou-se o Decreto que criou o Distrito de Manica, com sede na antiga vila com o mesmo nome. Sobre este território Paiva de Andrada escreveu uma curta memória descritiva, em 1890, e que reza o seguinte:

"Dá-se hoje o nome de Manica tanto ao antigo reino deste nome como ao vasto território que compreende tudo aquilo e que é limitado ao norte pelo rio Zambeze, o qual, por um decreto com força de lei do a no de 1884, constitui desde então um dos actuais dez distritos da província de Moçambique. É só da relativamente pequena terra do reino de Manica, ou de Manica propriamente dita, que me ocupo. O reino de Manica confina ao norte com o antigo reino do Barué e a terra de Unhama, sendo separado do primeiro pelo curso do rio Arângua, que mais próximo da costa toma o nome de Pungoé, ao noroeste e oeste com a grande terra Manhungue, sendo dela em parte separado pelo curso do rio Odzi; a oeste e a sudoeste com a terra Bocha, também separada de Manica pelo rio Odzi; pelo sul e sueste até à margem do rio Revué, com as terras Djingue e Vumba; e finalmente com a terra de Ganda, que compreende todo o território a leste de Manica, situado entre os rios Revué e Pungoé. Direi algumas palavras com respeito aos chefes de todas estas terras do distrito de Manica. O antigo reino do Barué é hoje propriedade particular de dois filhos de Manuel António de Sousa, que há muitos a nos estão a educar em Lisboa por conta do Estado, na Escola Académica, e são netos do velho Mocambo, falecido régulo, que solenemente determinou em vida que o seu reino passasse à propriedade destes seus dois netos. Unhama, que é separado do Barué pelo rio Caurese, afluente do Luenha, tem por chefe o régulo Saunhama, que mais deve ser considerado um Inhacuana ou muanamambo (autoridade) de um prazo da coroa, do que como um régulo. A grande terra de Manhungue, que se estende muito para o norte do território compreendido entre os rios Luenha e seu afluente Mazoé, que limita ao oeste com o rio Mucheque, e que mais para o sul se estende ao longo do Save entre este rio e o rio Odzi até ao limite da terra Bocha, tem como régulo um dos pretos mais inteligentes, mais simpáticos e mais dedicados ao Rei de Portugal que eu conheço; infelizmente é muito velho. É o nosso bem conhecido e sempre leal régulo Macone. Quando pequeno, esteve por bastante tempo na vila de Sena, e tem pelos brancos portugueses como que adoração. Pouco depois de eu e o Manuel António de Sousa termos chegado a Manica, tive notícias de que as manifestações de regozijo na povoação de Macone, quando souberam que estávamos próximos, foram comoventes, e que o régulo declarara que, se o rei de Portugal quisesse entregar a sua terra aos ingleses, ele com toda a sua gente abandonaria esta terra e iria para algum terreno que continuasse a ser verdadeiramente português. Este régulo tem numerosas forças muito aguerridas. As terras Bocha, Djungue e Vumba têm respectivamente como régulos Marangue, Zimunha e Chirara, todos régulos mais pequenos sujeitos a Gungunhana, e que desde a estadia de João de Resende em Manica, mantinham como ele frequentes relações. Ganda é ao mesmo tempo nome da terra e nome da butaca do régulo. É a terra de Quiteve, que já fica mais próxima da costa, fosse um prazo da Coroa. É na terra de Ganda que está a povoação de Chimoio, que tenho citado e é meu particular amigo. Tenho dito em que terras do reino de Manica está encravado. Com relação à sua geografia física e hidrográfica direi que a área deste pequeno território está situada na bacia hidrográfica dos três grandes rios, Pungoé ao norte, Búzi ao centro e leste e Save no sul e sueste. Com relação à bacia dos dois últimos grandes rios, podemos restringir a designação hidrográfica, dizendo, em substituição do que acabo de escrever, que o território de Manica está situado nas bacias dos rios Pungoé, Revué (que é um afluente do Búzi) e Odzi (afluente do Save). O território de Manica é todo muito montanhoso; vindo da costa pelo caminho que indiquei, entra-se nele subindo pelo vale do rio Revué. É na margem esquerda deste rio que estava a antiga vila, feira ou chuambo de Macequece, em ruínas há muitos anos, e que João Resende escolheu em 1888 para sede da Companhia de Moçambique, dando pouco depois à nova povoação ou chuambo o nome de Andrada, continuando a parte da terra de Manica em que a povoação está construída a ter o nome de Macequece. O vale do Revué terá aí dois quilómetros de largura, serpenteando nele o leiro actual do rio; vastas serranias cortadas em parte por importantes afluentes do Revué se elevam dum e doutro lado, separando, as que ficam da margem esquerda, a bacia do Revué da do Pungoé, e as da margem direita, a daquele rio da do rio Odzi. A povoação de Andrada está no vale, mas num pequeno "plateau" suficientemente elevado sobre o leito do rio; de sobre este terraço, a vista do nobre vale comas enormes serras ao norte e sul é realmente encantadora. A montante de Andrada, o vale do rio começa a estreitar-se; as serras de um e outro lado a aproximarem-se, encaixando-se mais o rio, que a uns vinte quilómetros já vai apertado entre elas, correndo em muitas cascatas aí e desde a sua origem, onde as duas linhas de serras já estão unidas; mais para norte e oeste das origens do Revué, tendo desaparecido a bacia central, o grande maciço de serras tem, para um lado, vertentes para o Odzi. Tendo na minha primeira viagem a Manica feito caminho pelo Barué e atravessado o Pungoé muito em cima e em altura onde a divisória das águas deste rio e do Revué tem mais de quatro mil pés, supus durante muito tempo que a bacia do Revué era um verdadeiro "cul de sac" e que não poderia ser aproveitada como via de grande penetração para o interior. Há três anos tive razões para supor o contrário e desde então repetidas vezes tenho minuciosamnte informado a Direcção Geral do Ultramar sobre o assunto, tratando da enorme importância económica que deve vir a ter o caminho de ferro, a que desde o princípio dei nas minhas comunicações o nome de caminho de ferro de Sanhate. Num dos ofícios que estão em viagem para Lisboa, dou detidas informações acerca de Andrada, descrevendo edifícios, citando dimensões, para demonstrar como é bem manifesta na localidade a efectividade de uma sólida ocupação. Por curiosidade histórica, João de Resende levantou, no ano de 1888, as muralhas do nosso antigo forte, e dentro dele fez muitas construções, incluindo a grande casa de alvenaria em que ele mora e estão os escritórios da companhia; fora do forte, há também casas de alvenaria e muitas construções de madeira onde moram empregados europeus, outras para hospedar mineiros e mais pessoal que por ali passa constantemente, e alijamentos para numerosos pretos de serviço. Entre as ruínas das casas do antigo chuambo há muitas que mostram ainda claramente todas as repartições interiores. Na maior parte, estas ruínas são de casas de que se sabe quem eram os antigos donos. Uma delas era de um tio e sogro de Manuel António de Sousa; e ainda vive em Macequece um preto, bem velho, falando correntemente português, que foi criado do falecido parente de Manuel António de Sousa e que habitou na casa a que me refiro. Também por curiosidade histórica, Manuel António de Sousa resolveu mandar levantar uma nova casa, exactamente no lugar e com as repartições que a antiga tinha, e para este fim já se tinha começado a limpar do mato e ervas o local das ruínas. A uns cinco quilómetros a montante de Andrada e do lado da mesma margem, tem o Revué um importante afluente chamado Chua, que se despenha de um "plateau" elevado e cujo curso depois se desenvolve  num largo vale que parece todo rodeado de enormes montanhas. Aí trabalham mais de vinte mineiros e operários portugueses, espanhóis e franceses, empregados todos da Companhia de Moçambique. As barracas, algumas em forma de bonitos "chalets", em que estes empregados da Companhia vivem, espalhadas pelas encostas dos montes, tinham uma aparência muito pitoresca, e a todos revelavam um centro de actividade de gente branca. Em todos os países, o tipo geral das construções dependo do material que para elas mais facilmente pode ser empregado. Os ingleses do Cabo e do Natal, que não têm o flagelo da mosca tsé-tsé, e podem fazer os seus transportes em carros, e que além disso, como no horroroso país em roda de Kimberley e em torno de grandes centros de actividade do Transval, não têm arvoredo, utilizam, como material mais económico e de mais fácil emprego, a folha de ferro ondulada para fazerem as suas habitações. À cabeça de carregadores e por entre o mato não é possível transportar grandes folhas de ferro, pesadas e flexíveis; por outro lado temos abundância de madeira; portanto, as nossas primeiras habitações, correspondentes às abafadoras barracas de folha inglesa, são de madeira e palha, aliás muito melhor abrigo contra o calor; mas esta diferença justificada do sistema de construção é frequente objecto de crítica e de censuras contra nós. Direi, como curiosidade, que o Dr. Jameson (4), portador das minhas recomendações, hospedado pela Companhia de Moçambique, o melhor que foi possível na estação Sarmento, numa barraca rectangular com duas repartições, asseada, e de confortável abrigo, quando deitado e lendo os jornais, teve a contrariedade de deitar fogo a esta barraca, comunicando-se o incêndio a todas as construções da Companhia de Moçambique que ali havia, do lado para onde soprava o vento. Quando soube da notícia, compreendi o aborrecimento que o doutro deveria de ter tido; mas não me deixei de ressentir um pouco, quando mais tarde, por acaso, encontrei publicada num jornal da África do Sul uma crítica desfavorável acerca da aparência caquética do chefe da secção de Sarmento, e da natureza inflamável das casas desta estação. Continuando nas informações acerca do Revué direi ainda que mais acima, quando o rio já está encaixado entre montanhas próximas, há a povoação de Mogudo, parente do Mutaça, chefe desta região, e o antigo e constante emissário do régulo nas suas relações com o comandante militar de Sena e capitão-mor de Manica. Nesta bacia do Revué há poucas povoações indígenas. Nas vertentes do Pungoé ou na região norte de Manica, o país ainda é mais deserto. Nos rios desta vertente, designados nos documentos antigos como sendo muito auríferos, tinha agora a Companhia de Moçambique alguns pesquisadores. Toda a linha divisória de águas entre as vertentes do Pungoé e as do Revué, dentro de Manica, tem uma grande cota, formando as serras entre os dois rios por toda a parte uma barraca que é muito difícil de transpor. Assim é claro que, salvo despesas excessivas com aberturas de túneis, ou construção de linhas funiculares, seria impossível fazer seguir um caminho de ferro como está marcado em projecto no mapa da província de Moçambique, vindo da costa pelo vale do Pungoé para, depois de já ter entrado em Manica, passar para o Revué; e o mesmo se daria se pretendêssemos que o caminho que efectivamente se há-de construir, da margem do Pungoé, atravessando no Quiteve, mais próximo da costa, e enquanto a divisória tem pequena cota, para a bacia do Revué, de entrando em Manica pelo vale deste rio, continuasse para o interior, passando nessa altura para o vale do Pungoé. Por este lado, pois, a penetração é quase impossível. A terceira grande bacia hidrográfica em que está situado o território de Manica é, como disse, a de Saveo, ou mais restritamente a do Odzi; este rio serve, do lado poente, de limite ao reino de Manica, e portanto todo o terreno a que me refiro está nas vertentes, ou directamente do rio principal, ou dos numerosos afluentes da sua margem esquerda. Para simplificar, citarei, a partir de jusante para montante, apenas, e por motivos especiais, três desses afluentes que não são geograficamente os mais importantes: o Sucura, o Mutare, que alguns ingleses nas suas correspondências designam pelo nome de Untáli, e o Zonzoro. Podemos teoricamente considerar estes três rios paralelos, indo sucessivamente confluir em três pontos da margem esquerda do Odzi, sendo os restantes vales, bem como os dos outros afluentes intermédios não mencionados, separados uns dos outros por grandes esporões muito elevados, junto das terras divisórias do Revué e do Odzi, das quais destacam, e que vão diminuindo de cota e desaparecendo à proporção que se aproximam do vale do último destes rios. Os dois primeiros citados afluentes nascem nas serras que separam a bacia do Revué do Odzi, o terceiro nasce mais a oeste, e quando o Revué já tem acabado, no grande maciço que separa o Odzi do Pungoé. As enormes serras que separam o Revué do Odzi são, tanto numa como noutra vertente, profundamente entalhadas por numerosos rios, entre os quais estão os três citados, por cujos vales se pode subir até atingir diversos colos ou gargantas onde, com mais ou menos facilidade, se passa duma para outra bacia hidrográfica. É nas vertentes do Odzi e seus afluentes que está a maior parte da população indígena de Manica; no Mutare e numa relativamente pequena área, que todos os pesquisadores declaram não ter na Califórnia, na Austrália ou em qualquer parte do mundo, rival em abundância e riqueza de filões auríferos, é que desde 1888 têm sido feitas as principais descobertas de filões, e é ali que estão, ou pelo menos estavam, muitos empregados da Companhia de Moçambique e a maior parte dos representantes e pesquisadores das empresas arrendatárias que têm pessoal em Manica. A aringa (5) do régulo Mutassa está situada na bacia hidrográfica de Odzi junto à margem do rio Zonzoro e portanto mais a oeste do que todos os outros lugares de que tenjho falado, o que explica como agentes da "British South Africa Company", vindo do interior e tendo atravessado o Odzi, chegaram à aringa do régulo sem que, nem no Mutare, nem no Chua, nem em Macequece ou em Andrada, o ponto que fica mais a leste, por alguns dias houvesse conhecimento da sua chegada. Parece-me que quem ler esta breve descrição que tenho feito poderá facilmente traçar um esboço, mostrando a posição relativa das diferentes localidades cujos nomes são frequentemente citados."

Após a independência de Moçambique os limites geográficos de Manica mantiveram-se inalterados mas, de Distrito, passou a Província.
(1) - Regimento, coluna militar; o mesmo que "manga".
(2) - Termo que definia o escravo guerreiro que, na Zambézia, servia militarmente o seu amo, o prazeiro (senhor dos prazos). O termo achikunda é uma forma aportuguesada do verbo chona-caranga "kukunda", que significa "vencer". Os achikundas teriam tido a sua génese por volta de meados do século XVII, sendo recrutados de diversos povos. O conjunto destes escravos armados, com funções militares, policiais, guarda-costas e também de caçadores, formavam os exércitos privados dos senhores dos prazos, chegando a atingir a casa dos milhares, nalguns casos. Pertenciam à elite dos escravos e não podiam ser vendidos. Era-lhes permitido escravizar elementos das populações vencidas nas suas incursões e mantê-los como sua propriedade. Só tinham funções de guerra mas, no correr dos tempos, com o decréscimo populacional devido a guerras, doenças, fome e o crescimento desmesurado do tráfico de escravos, levou muitos prazeiros a vendê-los pondo fim, deste modo, a uma tradição secular o que provocou, no decorrer do século XIX, diversas revoltas destes achikundas contra os seus donos. Com o advento do capitalismo e a lenta abolição do comércio esclavagista e um melhor domínio administrativo do poder colonial, os achikundas evoluíram para os sipaios.
(3) - Territórios integrados na actual República do Zimbabué.
(4) - Refere-se a Leandar Jameson, braço direito de Cecil John Rhodes (este já biografado em 31/12/2011), sendo ambos inimigos acérrimos dos portugueses.
(5) - Aldeia fortificada, de raiz zambeziana, cuja concepção poderá ter sido desenvolvida a partir da ideia dos musitus, mas em escala maior e com outros tipos de materiais, situadas juntos de cursos de águas ou estradas importantes, tendo funções quer defensivas quer ofensivas. Muralhadas a troncos de árvores entrelaçadas, ou pedras, com seteiras, podendo-se ainda levantar paliçadas e, por vezes, separadas por valas, estes recintos bem fortificados tinham, no seu interior, para além da casa do prazeiro e do seu pessoal, bem como do gado, todo o tipo de casas oficinais necessárias à manutenção da cidadela. Correspondia, no Sul, ao kraal ou aos cocolenes.


Leituras



Sobre Bartolomeu Dias e a sua época aponto dois bons romances históricos, cuja aquisição e leitura recomendo, a saber:

Registo o agrado que me proporcionou a leitura do romance histórico "Levante, 1487 - a vã glória de João Álvares", de José Maria Pimentel (Edição do Autor, 2010, 444 págs.) que se reporta à viagem em que, pela primeira vez, navios lusos liderados por Bartolomeu Dias, mergulharam as quilhas dos seus navios em dois oceanos: o Atlântico e o Índico.

Transcrevo aqui o esclarecedor conteúdo da contra-capa do livro: "Acontece na costa desértica do Namib. Três naus do Rei João de Portugal (duas caravelas e uma urca) lançam ferro num lugar já conhecido de antes como Angra do Salto. A escala leva apenas o tempo necessário para o transbordo de todos os mantimentos para as caravelas, que abalam logo depois para a descoberta mais ansiada do Rei - a passagem para o mar das Índias, pelo sul do grande continente africano.
Na Angra do Salto fica a esvaziada urca dos mantimentos. Fica também o capitão Diogo Dias, com o encargo de a aprovisionar com água e mantimentos até ao glorioso regresso das caravelas do seu irmão - o capitão-mor Bartolomeu Dias.
João Álvares é o mestre da urca, competente, com origem nobre, dotes de bravura e um mesquinho azedume contra os caminhos da política no Reino. Com ele, são nove os marinheiros que, durante nove longos meses, comungam na inóspita angra com os Kwepes locais desígnios inimagináveis. Chegam as caravelas do cabo e recolhem os sobreviventes e os sinais do drama, e transportam-nos até ao poderoso rio do grande Reino do Kongo, onde se consuma a missão do Rei João e se sepultam segredos."

Baseado em factos históricos que aconteceram, suportado por uma boa bibliografia, dotado dum interessante glossário alfabético para os leitores menos avindos a termos de antanho e narrado na primeira pessoa de seis dos participantes desta viagem que partilham, no meio de muitos outros camaradas da aventura, o exíguo espaço das embarcações, a escrita torna-se de tal modo cativante e galopante, que o livro se transforma numa máquina do tempo e nos leva aos idos de 1487 e, de leitor, nos tansforma num qualquer anónimo marujo ali presente.

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O outro romance histórico sobre Bartolomeu Dias que, há muito, me prendeu trata-se de "O navegador da passagem - a história de um descobridor de mundos que o Mundo ignorou" , da autoria de Deana Barroqueiro (Porto Editora, 2008, 437 págs.). A minha paixão pela escrita de Deana Barroqueiro não me tolda a mente nem me desfoca o sentir lúdico que tenho pelos pontilhados da ponta da sua pena. 

"O navegador da passagem" é o romance de um homem amargurado, que se sente injustiçado por, ao ter aberto as portas da estrada aquática da canela, do cravinho e do colorau (mas não tendo franqueado as mesmas) foi forçado a deixar que outros depois de si as passassem e, à premonição da chegada do seu fim, anunciado num cometa quando ia de navegação no Atlântico Sul, revê a sua vida, no muito que deu e no pouco que recebeu.

Deana Barroqueiro, consagrada capitã-mor desta imaginária jornada quinhentista, leva-nos a viajar  pelas cortes joanina e manuelina, puros viveiros de intrigas, maledicências e traições, onde tudo era válido pela benesse da proximidade do poder, traçando-nos os perfis de Dom João II e de Dom Manuel I , férreo o primeiro e sortudo o segundo, para além de nos fazer embarcar em naus claustrofóbicas, pútridas e sobrelotadas de anónimos miseráveis que pouco se apercebiam do gigantismo que estavam a construir, naus carregadas de febres, viscosidades e doenças mas, onde no meio deste pantanal de madeirame, era capaz de florir o amor ficcionado da escrava Leonor pelo seu amo.

Bem documentado, pelo que se pode observar pela bibliografia consultada, bem estruturado na sequência narrativa dos factos, e bem encorpado numa linguagem escrita que, atirando-nos por vezes para as expressões da época, torna-se clara quando enquadrada no todo do texto, é mais um livro que lustra as letras portuguesas. Aqui e em qualquer parte do mundo. Por isso, sem complexos e com o à vontade de quem nunca se cruzou com a Autora posso, camonianamente, dizer: "Ditosa Cultura que tal escritora tem". 

Poesia


Ao ler a paixão romanceada da escrava Leonor por Bartolomeu Dias, veio-me à memória uma personalidade que tive a felicidade de conhecer e que que me honrou fazendo o favor de ter sido meu amigo, conselheiro e, acima de tudo, meu Mestre.

Refiro-me ao Professor Fernando de Macedo, poeta e dramaturgo que, infelizmente para mim e para muitos, já partiu para a Grande Grande Viagem. Conheci-o num jantar de aniversário de Umbelina Gil,  cantor da ilha do Príncipe.
Oriundo de São Tomé, neto do último Rei angolar daquela ilha, intelectual de craveira, Professor Universitário (jubilado quando o conheci), resistente à Ditadura e "compagnon de route" de muitos que ousaram dizer "não" a quem não nos queria deixar dizer "não" e que, depois, inicia um longo e lento caminho para o conservadorismo e a redescoberta do cristianismo, deixou em mim, apesar de muitas saudáveis divergências, uma saudade imensa. 

Mas deixou-nos os seus escritos, parte dos quais eu tive o sublime prazer de os dactilografar em primeira mão.  Dum conjunto de poemas inspirados na leitura do livro "História Trágico-Marítima" (anotada por António Sérgio, Editorial Sul, Lda.) a que ele titulou de "Mar e Mágoa" (Edição do Autor, São Tomé, 1994, 99 págs.) retiro e transcrevo dois poemas, titulados de "Leonor, Leonor" e "O lamento da escrava", poemas estes que me foram trazidos à memória pelo leitura dos amores da escrava Leonor no livro de Deana Barroqueiro, acima referido.


Leonor, Leonor
Descalça ondulante
alva e nua
ancas d´arremesso d´ondas
areias pisando ardente.
Ah! Leonor
Olhos d´Eden perdido
seios renegando angústia
passo lento
sem destino apetecido.
Oh! Leonor
Em sensual tristeza
d´abandonado desejo
chão abraça em desespero
como se ela a natureza.
Leonor, Leonor!
Poema baseado no seguinte texto: "E vendo-se D. Leonor despida, lançou-se logo ao chão e cobriu-se toda com seus cabelos que eram muito compridos, fazendo uma cova na areia, onde se meteu até à cintura sem mais se erguer dali. Manuel de Sousa foi então a uma velha sua aia, que lhe ficara ainda uma mantilha rota, lha pediu para cobrir D. Leonor, e lha deu; mas contudo nunca mais se quiz erguer daquele lugar onde se deixou cair quando se viu nua." - História Trágico-Marítima; Perda do Galeão Grande São João; Pág. 35, Volume 1. 
O lamento da escrava
De mim, tens memória, senhor?
Sou quem ao fogo
te refugou peixe seco
e à noite te dava amor.
Sou aquela que escolheste
percorrendo a sanzala
(esta não, aquela sim)
fui eu a que recebeste.
Eu sei que outros levaram
o suor dos nossos corpos
e a muitos maltrataram.
Tu não foste assim.
Porque morreste, deixando
teu calor dentro de mim?

Poema baseado no seguinte texto: "Depois que André Vaz se apartou de Manuel de Sousa e sua mulher, ficou com ele Duarte Fernandes, contra-mestre do galeão, e algumas escravas das quais se salvaram três." - História trágico-marítima, Perda do Galeão Grande S. João, pág. 36, Volume 1.

///
Esta noite, quando fechar o computador, vou reler "Mar e Mágoa", beber um tinto amornado e saborear um cigarro forte (como ele o faria). E sei que terei por companhia Fernando Macedo, com a sua longa cabeleira branca afunilada em rabo de cavalo, o seu sorriso sarcástico e o seu humor bonacheirão. Mesmo em holograma a sua companhia é-me mais querida que muitos de carne e osso. 
Culinária
Leitor que sou de tudo o que a escritora Deana Barroqueiro escreve, tive oportunidade de, tempos atrás, ter lido uma receita de culinária que a mesma publicou no seu blogue, no pretérito 17 de Fevereiro, receita essa que se reportava a "Lulas à Coge Çofar".
Amante que sou de adquirir, entre diversas coisas, de revistas antigas de culinária tenho uma "Crónica Feminina Culinária" nº 11 (sem data de lançamento mas reportando-se à década de 60/70 do século passado) a qual contou com a participação "dos mestres de cozinha, doçaria e serviço de mesa do Hotel Ritz de Lisboa." (sic)
Ora bem descobri aí, na página 31, a receita do "Bolo da Rainha do Sabá", receita essa que, cá em casa, já produzimos (1). Não achei nada de especial no bolo e, ainda hoje, estou para saber o que teria a ver a mítica Balkis, Rainha do Sabá, com este bolo. 



Mas podemos fantasiar que foi o doce que ela, juntamente com  o Rei Salomão, manjou na única noite em que se amaram e cujo fruto se viria a chamar Menelik, génese de uma lendária linhagem dinástica etíope que viria a fenecer nos revolucionários idos de 1975, com a morte do Negus Hailé Selassié que, para muitos crentes do Kebra Nagast, foi o último descendente directo da Casa Real judaica.

Caramba, o que um bolo nos põe a fantasiar. Mas, de qualquer modo, aqui vai a receita que transcrevo sem qualquer alteração:

"Desfazem-se no almofariz 60 gr. de amêndoas. Derretem-se 125 gr. de chocolate, partido em bocadinhos, em duas colheres-de-sopa de água a ferver, deixando-se cozer durante 10 minutos. Há quem deite 2 colheres-de-café deste produto solúvel na água a ferver que se destina a derreter o chocolate.
Acrescentam-se 125 gr. de manteiga ao chocolate, trabalha-se de forma a obter-se uma massa, incorporando-se depois as amêndoas, o açúcar (125 gr.), a farinha (50 gr.) e 3 ovos. Mexe-se muito bem sempre que se acrescenta um novo elemento.
Unta-se uma forma de "charlotte" e deita-se-lhe dentro a preparação, que cozerá no forno, em banho-maria, durante 35 ou 40 minutos. Deixa-se arrefecer, desenforma-se e serve-se coberto com natas batidas adicionadas de açúcar baunilhado."
(1) Digo "produzimos" pois tenho uma parceria com a minha mulher: ela faz os bolos e eu como-os.


Vai acontecer

Durante o corrente mês de Março uma exposição comemorativa do centenário do nascimento de Manuel da Fonseca, figura grada das letras portuguesas do século XX, nas áreas do conto, crónica e romance. Na Biblioteca Museu da República e da Resistência (Rua Alberto Sousa - 10 A - Zona B do Rêgo - Lisboa) durante as horas normais de expediente. Entrada livre.

Encontro de escritores lusófonos onde tecerão comentários sobre o estado da literatura e poesia nos seus diversos países. No próximo dia 17 de Março, pelas 15H00, na Biblioteca Municipal Por Timor (Rua S.Bento - 182/184 - Lisboa). Entrada livre.

Exposição colectiva de artes plásticas, subordinada ao tema "Os Cavaleiros Templários". Entre os dias 18 e 30 de Março corrente, na Casa da Cultura dos Olivais (R. Conselheiro Mariano de Carvalho - 67/68 - Olivais - Lisboa).


Aconteceu

Mais uma vez o nosso mui amado Venerando Chefe de Estado voltou a borrar a pintura, agora a acertar contas atrasadas com José Sócrates, no seu prefácio do livro "Roteiros VI". O homem não acerta mesmo, coitado. Eu ando para aqui a cogitar que ele vai ter que nascer duas vezes para aprender a ser um político a sério. Sobre este seu comportamento muito se tem escrito e eu nada de novo viria para aqui  debitar. Até porque quase ninguém me lê e ninguém me liga nenhuma, que é o mais certo. Mas, de qualquer modo, de tudo o que se escreveu recomendo a leitura do artigo de opinião de Gonçalo Bordalo Pinheiro que, sobre este tema, publicou na Visão nº 411, subordinada ao título "As perguntas da semana". Lapidar.

Leio no Público que os golfinhos voltaram ao Tejo. Mas apenas pintados nas sapatas da Ponte 25 de Abril. É pena, mas é o mundo em que vivemos. É tudo ou quase tudo fictício, virtual, a fingir.

A Procuradora Cândida de Almeida, Directora da Direcção Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), estranhou que se tivesse feito burburinho por a Caixa Geral de Depósitos (CGD) ter patrocinado um Congresso do Sindicato que os representa. Disse a senhora que a escolha do banco se devera a ser do Estado, com dinheiros 100% públicos e não correr nenhum processo crime daquela instituição bancária. Azar. Quatro dias depois (13/03) destas afirmações o Diário de Notícias parangonava uma notícia onde quatro gestores da CGD tinham sido acusados pelo DIAP de Évora por burla tributária. Anda a dormir esta senhora?

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